Ano 01 nº 54/ 2020: Ascensão e Queda da Patota Golpista de 2016 - Jutaí Santos

boletim 54


A conjuntura ...

 

ASCENSÃO E QUEDA DA PATOTA GOLPISTA DE 2016

 

Jutaí Alves Dos Santos

Historiador

 

luta de classes

Colagem por Canellas

 

Pouco mais de 4 anos separam o impeachment de Dilma Rousseff da presente data, onde o governo reacionário de Jair Bolsonaro se aproxima dos 730 dias de "gestão". Nesse ínterim, assistimos a ascensão e queda livre dos protagonistas do golpe civil, midiático e parlamentar que afastou Dilma do poder em 2016.

Rememorando aqueles lúgubres dias de 2015 e 2016, é possível verificar além do eixo midiático antipetista capitaneado pelos grupos Globo e Abril, da ascenção da classe média Lava Jatista e do conluio empresarial representado pela FIESP, a presença também de um corpo jurídico utilizado para legitimar a falácia dos tais crimes de responsabilidade atribuídos à gestão Dilma Rousseff.

Esse tal corpo jurídico, embora contasse com a presença de inúmeros personagens da magistratura judicial brasileira, acabou personificado na figura dos três responsáveis por apresentar a denúncia de crime de responsabilidade, os juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr, e a advogada Janaína Paschoal.

Naqueles dias tensos do início da segunda metade da década de 2010, o dissidente petista, o ex-ministro da Justiça do governo FHC e a advogada tucana, formavam ao lado do ovacionado juiz Sérgio Moro uma espécie de quarteto de ferro anti PT. Em torno desses astros gravitaram alguns satélites "ilustres": Míriam Leitão, Reynaldo Azevedo, Marco Antônio Villa, Modesto Carvalhosa, Lobão, Kim Kataguiri, e uma infinidade de outros anti-petistas de ocasião, que procuravam simbolizar em suas áreas de atuação a epidemia anti-petista que tomava conta do país.

Todos eles, em maior ou menor grau, acreditavam que sangrar o PT até a morte significava manter os caminhos abertos para a vitória nas urnas em 2018 de um projeto neoliberal (já iniciado por Temer, com o plano de governo do PMDB, intitulado Ponte para o futuro) em âmbito nacional, capitaneado pelo PSDB e com apoio de outras legendas com afinidade ideológica com este partido, como o DEM, o próprio PMDB e partidos do centrão dissidentes da coligação que ajudou a reeleger Dilma Rousseff em 2014.

De fato, naquele primeiro momento, pós Golpe Parlamentar, parecia ser mesmo este o horizonte que se desenhava, sobretudo pelo êxito eleitoral dos partidos golpistas nas eleições municipais daquele ano de 2016. Eleições nas quais algumas figuras centrais do anti-petismo da classe média Lava Jatista (mais notadamente o Movimento Brasil Livre-MBL) se lançaram candidatos a vereador por legendas coligadas como o DEM, o PSDB, o PRB e o PV, fazendo cair por terra o seu discurso de sociedade civil organizada e apartidária, que tanto apregoavam na campanha pró-impeachment.

Porém, a ascensão de Jair Bolsonaro em 2017, e sua subsequente escalada popular em 2018, desestabilizou os planos da patota golpista, que observava seu candidato oficial Geraldo Alckmin minguar nas pesquisas de intenção de voto para o pleito eleitoral de outubro de 2018. A malta golpista não tardou em direcionar seu apoio para o candidato oficializado pelo PSL, inclusive com o centrão abandonando o candidato tucano e indo cerrar fileiras com o capitão reformado. Naqueles dias não era raro ouvir Miriam Leitão afirmar que Bolsonaro poderia trilhar um caminho democrático, ou o MBL dizer que votar em Bolsonaro significava votar no projeto neoliberal de Paulo Guedes, ou mesmo Marco Antônio Villa bradando que, com Moro no governo, a Lava Jato estaria garantida e as instituições democráticas preservadas! Prova irrefutável de que o fascismo é sempre o plano B das classes dominantes.

Com Bolsonaro eleito e arrastando consigo um expressivo núcleo olavista e obscurantista, designados para as funções de ministros, presidentes de instituições governamentais, líderes do governo no Congresso etc, a matilha golpista percebeu que não seria tão simples manejar, operar e controlar o capitão saudosista da ditadura militar. Em menos de um ano de governo, já era possível contabilizar dezenas de correligionários do presidente miliciano, agora transformados em desafetos: Janaína Paschoal, Alexandre Frota, Joyce Hasselman, Gustavo Bebianno....A lista é quase infindável, daqueles que apoiaram o governo fascista e depois se viram sobre a mira de Bolsonaro, seus filhos e seus fanáticos seguidores. Mais recentemente, o caso do ex-paladino da justiça Sérgio Moro parece ser o mais emblemático de tal realidade.

Assim como Carlos Lacerda, Adhemar de Barros, Juscelino Kubitschek, entre outros na conjuntura do golpe de 1964, o consórcio golpista da atualidade também não logrou êxito em uma participação mais expressiva na divisão dos louros da vitória que o fascismo obteve nas urnas em 2018. Muitos dos golpistas de outrora, agora sofrem com o repúdio e perseguição das hordas bolsonaristas , que os enxergam como traidores, inimigos e potenciais ameaças ao ídolo fascista. Que o diga Joyce Hasselman, ridicularizada e difamada pelo gabinete do ódio, Rachel Sheherazade perseguida por Luciano Hang, Sérgio Moro ameaçado em sua integridade física, entre tantos outros exemplos.

Enquanto Miguel Reale Jr. defende uma junta psiquiátrica para avaliar a sanidade do presidente miliciano, Blairo Maggi se desespera com os ataques da família Bolsonaro à China, Vera Magalhães lamenta os ataques aos profissionais da imprensa e os Chicago Boys mirins do MBL acusam de falsas as proposições neoliberais de Paulo Guedes, o Brasil assiste à maior crise epidemiológica dos últimos 100 anos, ao ápice do desemprego estrutural, à destruição dos biomas brasileiros e ao apogeu do negacionismo anticientífico sem que nenhuma das figuras golpistas de quase meia década atrás se levante para acusar Bolsonaro de crimes de responsabilidade.

Enfim, a patota golpista ganhou mas não herdou (pelo menos não como gostariam) a vitória política conquistada com o impeachment de Dilma Rousseff. E, para piorar, agora assistem a um dos mais inexpressivos reservas naquele jogo golpista de 2016 brilhar como titular no campo reacionário desse imenso estádio chamado Brasil. Mas, alguém duvida de que eles fariam tudo novamente, caso fosse necessário barrar uma volta do PT ao poder em 2022?

 


Expediente

Comitê de Redação: Adriana Marinho, Vivian Ayres, Rosa Rosa Gomes.
Conselho Consultivo: Dálete Fernandes, Carlos Quadros, Gilda Walther de Almeida Prado, Daniel Ferraz, Felipe Lacerda, Fernando Ferreira, Lincoln Secco e Marcela Proença.
Publicação do GMARX (Grupo de Estudos de História e Economia Política) / FFLCH-USP
Endereço: Avenida Professor Lineu Prestes, 338, Sala H4. São Paulo/SP. CEP: 05508-000

Email: mariaantoniaedicoes@riseup.net