Ano 2 nº 45/2022: Notícias de pesquisa - Lula entre o Neoliberalismo e Demandas Populares - Vinícius França

boletim2-45


Notícias de pesquisa ...

 

LULA ENTRE NEOLIBERALISMO E DEMANDAS POPULARES: OLHARES DA IMPRENSA SOBRE 2003

 

Vinícius França

Professor de História do Ensino Básico e doutorando em História Econômica-USP

 

Cartão-postal da Sturm, ilutrado por Kurt Schwitters, "Imagem do Trabalhador", 1919. Fonte: https://sammlung-online.berlinischegalerie.de:443/eMP/eMuseumPlus?servi…

 

Baby, compra o jornal / Vem ver o sol

Ele continua a brilhar /Apesar de tanta barbaridade...

Baby, escuta o galo cantar /A aurora dos nossos tempos

Roberto Frejat e Dulce Quental, “O poeta está vivo”[1]

 

A mudança de ano coloca em circulação um pensamento sobre a mudança. O feriado da confraternização universal[2], que recomeça a contagem dos meses, dialoga com o início dos tempos: como nos mitos de criação, fala-se sobre as possibilidades de novas realidades, mudar hábitos, afastar males antigos e ter esperança no futuro. Uma mudança atingirá a todos, seja pelas novas atitudes ou por forças sobrenaturais que regeriam o calendário. Misturado a esse sentimento existe a perspectiva de outra mudança, a eleição de Lula como Presidente da República, colocando fim aos 4 anos de governo Bolsonaro[3]. Aqui reside um limite do sentimento coletivo do Réveillon, a esperança pela eleição de Lula é de parte da sociedade, outras esperam pela continuidade do governo Bolsonaro ou apostam em outros candidatos. A política é um campo em que não há confraternização universal, nela há personagens antagônicos e interesses conflitantes.

O pleito de outubro guarda uma expectativa inédita: pesquisas divulgadas em dezembro de 2021 apontam que cerca de 60% do eleitorado tem intenção espontânea de voto em dois candidatos: Luís Inácio Lula da Silva (40%) e Jair Bolsonaro (20%). Tal definição da intenção espontânea costuma ser encontrada muito mais próxima da data da eleição, o que indica que ela retoma a disputa de 2018[4], quando a prisão de Lula impediu o embate direto com Bolsonaro. Para refletir sobre a esperança em torno da eleição de Lula, a trajetória do Partido dos Trabalhadores no poder e os limites da sua atuação, este texto propõe a observação de como foi retratado e pensado o momento em que Lula assumiu a presidência pela primeira vez, em 01 de janeiro de 2003 pelos jornais O Globo (OG) e Folha de São Paulo (FSP). Questionou-se qual foi o retrato daquele tempo que se iniciava com a chegada de Lula ao poder construído pelos jornais.

O recorte privilegiou os dois jornais de maior circulação nacional: em 2020, a FSP foi o jornal mais lido do país, somando edições impressas e digitais, seguida por OG[5]. A FSP é líder de mercado desde o fim dos anos 1980[6]; já OG, além de estar entre os periódicos mais lidos do país, é vinculado ao Grupo Globo, dono do canal de televisão brasileiro de maior audiência há décadas. Assim, julga-se que a pauta do jornal deve estar próxima do canal de televisão que atinge grande porcentagem dos lares do país. A escolha também ponderou o fato de serem dois jornais sediados em cidades diversas, um de São Paulo e outro do Rio de Janeiro, fator que pode matizar a cobertura. Também é interessante notar que os dois periódicos pertencem a grupos de mídia que apoiaram o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 e depois tornaram-se alvo de ataques de Bolsonaro, durante seu governo.

As edições foram encontradas nos sites Acervo Folha e Acervo O Globo[7]. A análise privilegiará as capas e os editoriais, textos com a opinião oficial do jornal. A capa é o elemento mais externo e chamativo do jornal, que será visto nas bancas e deve atrair a compra do periódico. Assim, ela pretende fazer uma síntese do que ocorre de mais importante naquele dia, ser “o rosto do mundo”[8]. Já o editorial é um texto opinativo, normalmente encontrado nas páginas internas do jornal, em que ele constrói o ponto de vista institucional sobre um assunto específico[9].

A análise não considera que os meios de comunicação disseminam ideias de forma neutra. Seja em textos opinativos ou informativos, a imprensa expressa falas de caráter privado que buscam por legitimação coletiva[10]. Os jornais – assim como diversos sites da internet, rádios, tvs, revistas, etc. – são empresas competindo por consumidores de informação. O seu financiamento, através da venda das edições impressas ou do acesso a suas notícias na internet, anunciantes e outros negócios, deve ser levado em conta ao observar os seus textos e posicionamentos.

A FSP pertence ao Grupo Folha, que também é dono no Instituto de Pesquisas DataFolha e tem participação no portal de internet Universo On Line, entre outras empresas[11]. No momento observado, 2003, o grupo possuía o jornal de maior circulação do país e um dos sites mais acessados na internet. Durante os anos 2000 a Portugal Telecom foi sócia do UOL, até 2011, quando vendeu a sua participação nas ações[12]. OG pertence às Organizações Globo, maior grupo de mídia da América Latina, que controla não só a TV Globo, mas também várias rádios pelo país[13]. O Grupo Globo ainda teve atuação no mercado de telefonia, sendo sócio da empresa NET, de 1991 até 2014, quando foi incorporada pela Claro, que até então era sócia do negócio[14]. Os dois grupos, Folha e Globo, já se associaram para a criação do jornal Valor Econômico, em 2001, até que o Grupo Globo se tornasse único proprietário em 2016[15].

Sobre o papel político da imprensa e da opinião pública, este texto recorre à definição de Gramsci: é necessário que as ideias particulares de uma classe ou de uma fração dela no poder tornem-se ideias gerais, aceitas de forma ampla pela sociedade, para que o poder seja conquistado e mantido. Dessa forma, os detentores do poder não o exercem baseado apenas na força, na coerção, mas também no consenso, no apoio aos seus valores e ao seu projeto, que é fruto do convencimento da maioria da população. Acresce que as várias formas de difusão ideológica presentes na sociedade civil – imprensa, igrejas, livros, escolas, redes sociais, etc. –   têm um papel-chave para que a classe dominante conquiste o consenso[16].

Após realizar a análise da cobertura da imprensa, o texto interpreta o início do governo Lula em 2003, observando [17], delineado por Fernand Braudel, como um período que se estende por algumas décadas em torno de certos pontos de coerência. Tais pontos seriam a emergência do projeto neoliberal em conflito com a demanda por direitos sociais, elementos que se colocam desde os anos 1980.

 

Os jornais em 1 de janeiro de 2003

 

O “rosto do mundo” representado pela FSP na capa de quarta-feira, 1/1/2003, foi de um momento inédito: o início de um governo popular. A manchete apontou a boa expectativa de 76% dos brasileiros sobre o governo Lula e a foto principal destacou participantes de uma caravana da região pernambucana onde nasceu Lula. Ela está em frente à catedral de Brasília com uma faixa onde se lê, “Garanhuns e Caetés saúdam Lula, o primeiro presidente dos que nunca tiveram governo”. A faixa lembra uma frase que, posteriormente, foi bastante falada por Lula na presidência ao afirmar suas realizações: “Nunca antes na história desse país…”, apontando a singularidade histórica de seu governo e da representação das classes populares nele. Notas presentes na capa  sobre a família de Lula e a sua intenção de construir um “novo contrato social” reforçaram essa impressão.

Além disso, o jornal estabeleceu relações com o projeto de desenvolvimentismo e integração nacional anterior a 1964 ao noticiar que Celso Furtado seria convidado pelo governo para a recriação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), órgão que ele criara durante o governo Juscelino Kubitscheck. E também relembra que era a primeira vez desde 1961[18] que um presidente eleito diretamente transmitia a faixa a outro alçado ao poder da mesma forma.

Momento histórico, sujeitos tradicionalmente excluídos encontrando representação no governo e retorno a algumas características anteriores do golpe de 64: é isso que a FSP expôs nas bancas como a grande síntese do dia. Já a opinião institucional do jornal, impressa na página 2, no texto “Esperanças e temores”, demarcou um distanciamento do otimismo popular apontado na capa[19]. A esperança estava vinculada ao percentual recorde de pessoas otimistas com ele, 76%, à consolidação da democracia de massas no Brasil (a eleição de 2002 mobilizou às urnas 65,7% da população contra 22% em 1961) e à trajetória de Lula, ligada às classes populares. Os temores remetiam aos problemas econômicos e ao aumento da inflação em 2002 somados às poucas possibilidades de manobra que a globalização e os mercados financeiros impunham ao Brasil.

Assim, o governo estaria destinado a tomar decisões “no fio da navalha”, pressionado pelos setores populares que o elegeram, de um lado, e pelo mercado financeiro, de outro. O segundo agente já estava sendo atendido desde a transição do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), visto o alinhamento entre o Ministro da Fazenda de Lula, Antônio Palocci, e o de FHC, Pedro Malan. Entre a massa e o mercado financeiro, o jornal se alinha ao segundo, desrecomendando políticas econômicas heterodoxas (que se afastassem do paradigma liberal) e medidas populistas.

A capa de OG destacou o ineditismo do governo com a manchete: “Primeiro presidente de esquerda, Lula assumirá pregando conciliação”. Além do governo, a capa de OG também deu evidenciou a mudança de ano, simbolizada pela queima de fogos em Copacabana, que ocupou o topo da página. Abaixo, a mudança no poder foi noticiada com fotos dos personagens da elite política: Lula, a primeira-dama Marisa Letícia, o vice José de Alencar e FHC, que entregaria o cargo. Nas legendas, FHC arruma gavetas, surgindo como alguém que trabalha até o último momento; merece destaque o nome do chef de cozinha que atuou no jantar de ano-novo de Lula, Karl Marx, mas as roupas do presidente eleito não são vermelhas, são brancas como indica a tradição. Pequenos detalhes que representaram um Lula ambíguo, realizando uma travessia ideológica e evitando uma ruptura.

Os textos reforçaram a suavização das mudanças, descrevendo que Lula sinalizava um governo por meio da conciliação e do diálogo, buscando “mudança sem sobressalto”. Também foram citadas as primeiras medidas no poder: uma comissão ministerial para impulsionar programas sociais, cortes de gastos de gabinete em ministérios e providências para ocupar o número relevante de vagas ociosas nas universidades federais. Havia ainda a chamada para um texto de Zuenir Ventura que sublinhou o recente momento democrático do país: ele iria realizar o sonho de uma geração ao assistir a uma posse presidencial histórica. Nesse ponto, assim como FSP, OG lembrou a sombra do fim recente da ditadura militar (havia 17 anos que o primeiro governo civil tinha chegado ao poder), mas com menos força do que o concorrente.

No editorial, que se encontra na página 6, OG tomou firme posição pela continuidade histórica de Lula com o governo FHC. O texto “Desafios” destacou que o forte otimismo com o novo governo era também uma ameaça. Ele observou o número expressivo de votos de Lula, 52 milhões de sufrágios[20], porém as suas responsabilidades seriam maiores que a força desse número. Sobre o otimismo, ele poderia ser uma armadilha, pois o governo não atenderia no curto prazo aos anseios por renda e emprego e as pautas da militância petista eram irrealizáveis. O governo deveria entender que o país não estava sendo construído do zero e recusar o populismo e caudilhismo latino-americanos, elementos já extirpados em nosso processo de redemocratização.

A desigualdade social foi mencionada como um problema menor que perduraria pois, “dramas sociais não serão abolidos por decreto”. O governo só seria bem aventurado se consolidasse a modernização, ao manter e aperfeiçoar os “fundamentos de um novo país” realizados por FHC: seus avanços em educação e saúde, a Lei de Responsabilidade Fiscal e uma “cultura de transparência administrativa”. Assim, OG aplaudiu que a direção do PT tenha aderido a uma política de alianças, suavizando seu passado de esquerda e aproximando-se, assim, da trajetória de FHC. O periódico também apoiou as declarações de Palocci e José Dirceu sobre honrar dívidas internas e externa, combater a inflação, não reduzir a taxa de juros de forma brusca e valorizar as exportações. Também viu “amadurecimento” na presença de empresários em ministérios e de Henrique Meireles, ex-presidente do BankBoston e deputado federal eleito pelo PSDB em 2002, dirigindo o Banco Central no novo governo.

Os dois jornais apontaram a ascensão de um líder que tocava as esperanças das classes populares de forma inédita. No entanto, o horizonte das mudanças que poderiam atendê-las estava limitado. FSP reconheceu que uma agenda popular estaria presente, mas seu predomínio não era nem viável nem desejável. OG tomou uma posição mais conservadora e sequer a legitimou, recomendando a continuidade do tempo anterior, das medidas de FHC (ainda que dentre elas estivessem os modestos programas sociais tucanos).

Houve algumas diferenças na abordagem dos dois jornais: FSP fez referências ao momento democrático anterior a 1964 e fotografou as classes populares como agente político; OG estava focado nos grandes personagens políticos e privilegiou as referências temporais do governo FHC, ele teria fundado um novo tempo que deveria continuar. No entanto, ambos foram uníssonos na recusa do populismo – leia-se, de políticas que aumentassem o envio de recursos para distribuir renda e acesso a direitos sociais – e no alinhamento com o mercado financeiro. Lula poderia ser popular, mas, sua margem de manobra orçamentária visando as classes populares era mínima.

Retomando a discussão gramsciana, os jornais estavam disseminando concepções neoliberais, para que elas se tornassem um consenso e os interesses privados aqui representados sobre os recursos do orçamento se tornassem gerais, interpretados pela maioria como interesse público. Disseminado no Brasil a partir dos anos 80, o neoliberalismo teve na imprensa um dos primeiros setores de adesão[21]. Essa ideologia é uma expressão da dominação do setor financeiro sobre o sistema capitalista internacional a partir de 1945 e sua aplicação no contexto brasileiro desde os anos 1990 aumentou a penetração do capital externo na economia. Isso é coerente com os negócios dos dois grupos de mídia analisados: eles tinham sociedades com o capital externo ligado à telefonia em 2003; e posteriormente, passaram a atuar no setor financeiro.

 

A conjuntura: embate entre a conquista dos direitos sociais e o neoliberalismo

 

O tipo de desenvolvimentismo implantado pela ditadura militar estava baseado nos investimentos estatais na indústria e infraestrutura, acompanhado de grande ampliação da desigualdade social. No fim dos anos 1970, com o aumento dos preços internacionais do petróleo e a alta dos juros praticados pelos EUA, o Brasil entrou numa crise caracterizada por escalada da dívida externa e hiperinflação. Sucessivos pacotes econômicos fracassaram e resultaram em dois empréstimos concedidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), em 1982 e 1988, e uma moratória da dívida externa, em 1987[22].

A falência do modelo econômico do regime reafirmou os limites da acumulação capitalista periférica no Brasil. Tal quadro motivou o fim da ditadura. Foi a partir de acordos entre militares e burguesia que os primeiros controlaram o processo de transição e a passagem do poder para os civis, desde os anos finais da década de 70.

Porém, a década de 1980 foi atravessada pela intensa mobilização de outros sujeitos, que escapavam do plano de transição tecido por cima: sindicatos e movimentos sociais ressurgem de forma intensa, retomando de fato os direitos de mobilização e greve que o regime havia cassado na letra da lei. A quantidade de greves cresce no correr daquela década, passando dos pioneiros metalúrgicos a vários outros setores como funcionários públicos, professores, etc. Duas centrais sindicais foram formadas, CUT e CGT, e cinco greves gerais foram convocadas nos anos 1980[23]. A formação do PT e a ascensão de Lula como líder sindical e político ocorreram dentro desse contexto[24]. Foi a tomada do espaço público pelos movimentos sociais que sinalizou a construção de uma República efetivamente nova[25], não a transição pactuada entre burguesia e regime.

O choque entre o bloco do poder estremecido pela crise econômica e o ascendente poder popular ocorreu em várias ocasiões, como na Campanha pelas Diretas em 1984 e na reinvindicação da convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva, ambas pautas perdidas pelos movimentos sociais[26]. No entanto, tal contexto levou à escrita de uma Constituição, finalizada em 1988, que reconheceu vários direitos sociais - saúde, educação, previdência, direitos trabalhistas, o uso social da propriedade que dá a possibilidade de distribuir terras, etc.

O modelo de acumulação anterior em crise e a mudança de regime colocaram as classes dominantes em dissenso, o que caracterizou uma crise de hegemonia[27]. O fracasso do Plano Cruzado, lançado em 1985, reforçou a impressão de que o modelo econômico de intervenção estatal e substituição de importações do Governo Sarney não era viável. Nesse momento o neoliberalismo ganhou terreno para se tornar um novo modelo de acumulação para as elites.

Os neoliberais defendem uma retirada radical da presença do Estado na economia e o predomínio das relações de mercado por meio de medidas como: privatização de empresas públicas, retirada de impostos sobre a renda, desregulamentação do mercado de trabalho e dos fluxos de capitais e fim das políticas protecionistas e dos gastos sociais do Estado. Trata-se de uma doutrina econômica que ganhou força após a 2a Guerra Mundial e, nos anos 1980, tornou-se uma agenda de governos como os de Margareth Thatcher na Inglaterra (1979-1990) e Ronald Reagan nos EUA (1981-1989), sendo adotada depois em vários países[28].

Nota-se no caso brasileiro uma relação diametralmente oposta entre o reconhecimento inédito de direitos sociais na Carta de 1988 e o projeto neoliberal – tal reconhecimento coloca o Estado na obrigação de intervir para garantir o acesso aos direitos de forma universal e gratuita com escolas e hospitais públicos, a Previdência Social, programas de distribuição de renda, etc. A demanda pela efetivação dos direitos reconhecidos nega a ideia de que os serviços ligados a eles devem ser todos fornecidos pelo mercado, ou seja, de forma paga e excludente, algo central na ideologia neoliberal.

No Brasil, ela esteve presente inicialmente nos governos Collor e Itamar e consolidou-se no governo FHC. Nesses períodos, o Estado privatizou dezenas de empresas como bancos, siderúrgicas, indústrias químicas, ferrovias, mineradoras, rodovias, aeroportos, etc.; quebrou o monopólio de outras empresas que permaneceram estatais como Correios e Petrobrás; realizou uma reforma administrativa, permitindo a terceirização e a demissão de servidores públicos e uma reforma da previdência, no governo FHC (ocorreram outras duas, nos governos Lula e Bolsonaro).  Também aconteceu a abertura comercial e financeira da economia, com a retirada de mecanismos que protegiam o capital nacional. Além disso, a paridade cambial entre o real e o dólar entre 1994 e 1999, barateou as importações, facilitando a entrada de produtos estrangeiros[29].

 O capital transnacional comprou empresas públicas e privadas e o capital financeiro, tanto externo quanto nacional, tornou-se hegemônico no bloco das classes dominantes. A abertura da economia, as fusões e a quebra de empresas nacionais, assim como novas formas de gestão e o uso da tecnologia levaram à concentração de renda, ao forte aumento da taxa de desemprego (chegou a 19% da PEA na cidade de São Paulo em 2003) e ao crescimento da precarização e informalidade do trabalho. Os sindicatos se enfraqueceram com esse contexto, colocando-se na defensiva e priorizando uma estratégia pragmática de resultados.

Em 1999, houve ajustes na agenda: com o fim da paridade cambial entre real e dólar, priorizou-se obter superávits comerciais baseados na exportação de commodities[30], garantindo ao capital financeiro o retorno dos seus investimentos com os dólares da balança comercial[31]. Embora as políticas de FHC tenham mantido a vitória contra a hiperinflação, elas trouxeram desequilíbrio das contas externas e vulnerabilidade a ataques especulativos e fuga de capitais. Ocorreram seis crises cambiais em seu governo. A última foi em 2002, quando o dólar passou de cerca de R$ 2,60 para R$ 4 – uma reação do mercado financeiro à vitória eleitoral de Lula, que viria a ocorrer em outubro. Tal crise levou a outro empréstimo acertado com o FMI em agosto daquele ano.

No mês anterior, o PT lançou o documento “Carta aos Brasileiros”, em que se comprometeu a manter os mecanismos da política econômica de FHC que favoreciam a subordinação do Estado ao capital financeiro: regime de metas de inflação, taxas de juros altas, câmbio flutuante e política de superávits fiscais. Lincoln Secco analisa: “a esquerda ganhou parte do poder, mas perdeu a hegemonia para os ideólogos dos mercados financeiros”[32].

A manutenção das políticas de FHC durante o primeiro mandato de Lula levou a cobranças por uma mudança de rumos que possibilitasse um maior crescimento econômico, dentro do próprio PT e de alguns setores da burguesia, como os empresários industriais. Ela só ocorreu a partir de 2006, com a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda[33]. Desde 2004, as taxas de crescimento superaram a média de 2%, presente entre 1995 e 2002, o que se manteve até 2014. O período de 2006 a 2010 foi o mais positivo, com média de crescimento de 4,3%[34].

Esse crescimento teve motivação externa, devido ao aumento do preço internacional das commodities exportadas pelo Brasil; e também interna, por meio de políticas de investimento estatal em infraestrutura, expansão do crédito e distribuição de renda, com a valorização do salário mínimo e o programa de transferência de renda Bolsa Família[35]. Tais medidas tornaram mais forte o mercado interno e reduziram a desigualdade social. O índice de Gini, que mede a desigualdade de renda, chegou ao valor mínimo histórico em 2015 (0,524). O quadro de crescimento econômico e inédita redução da desigualdade pode ser associado a outras três vitórias do PT nas eleições presidenciais de 2006, 2010 e 2014[36].

Porém, os dois fatores foram revertidos a partir de 2015: houve declínio do PIB de 3,5% e de 3,3%, em 2015 e 2016; e a desigualdade social voltou a crescer, tornando-se cada vez mais aguda com o passar dos anos[37]. Algumas explicações para a recessão são o declínio do preço internacional das commodities desde 2011; o fracasso da política econômica visando o estímulo da indústria pelo primeiro governo Dilma; e a crise política ligada a Operação Lava-Jato, que se iniciou em 2014. Todos esses fatores influenciariam no impeachment arbitrário de Dilma Rousseff em 2016; no desmonte das políticas de intervenção estatal (que já começou a ocorrer em 2015, no segundo mandato de Dilma) e distribuição de renda pelos governos Temer e Bolsonaro; e na eleição do último, favorecida pela prisão de Lula em 2018. A prisão, que ocorreu a partir de um processo controverso ligado a operação Lava-Jato, só foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal em 2019.

 

Considerações Finais

 

O texto observou duas tendências em confronto: a demanda por direitos sociais, ancorada na mobilização social na década de 1980, que influenciou a Constituição de 1988, mas que ainda pedia um longo caminho de lutas pra se tornar realidade; e o novo modelo de acumulação ao qual houve adesão das classes dominantes e, desde os anos 1990, de sucessivos governos federais, o modelo neoliberal. Os jornais, próximos do segundo elemento, cobravam a manutenção da agenda neoliberal do nascente governo Lula em 2003.

Lula, a princípio identificado ao primeiro elemento, fez um governo de conciliação de classes: manteve as políticas de FHC, mas elevou o compromisso do Estado com a distribuição de renda para outro nível.  Não foi possível, nesses primeiros anos, derrotar a agenda neoliberal; o que houve ali foi uma difícil conciliação entre as duas tendências em confronto, o que correspondeu a uma conciliação de classes.

Posteriormente, com as vitórias eleitorais seguintes, os governos petistas se afastaram da agenda neoliberal, mas ela se mostrou persistente e tornou-se dominante novamente em 2015. Finalmente, o acordo com as elites entrou em colapso, com o processo de impeachment e a prisão de Lula. Da conciliação de classes de 2003 passamos a um cenário político tempestuoso, onde cabem golpe parlamentar, atos jurídicos arbitrários, constante desgaste das instituições e a emergência de um governo fascista, que ameaça frequentemente a democracia.

Em paralelo à deterioração política, houve deterioração socioeconômica. No início de 2022, há mais de 620 mil mortes por covid-19 (um dos países com mais mortes do mundo); forte desemprego (12,6%, uma das maiores taxas das principais economias mundiais)[38], aumento do custo de vida (a inflação foi de 10,67% em 2021, com fortes altas dos preços dos alimentos e dos transportes)[39]; e aumentos dos índices de fome e insegurança alimentar (15% e 59% dos domicílios, respectivamente. O último dado era de 23% em 2013)[40].

Hoje, Lula volta a estar no centro da tensão entre os interesses do mercado financeiro e a necessidade de atender as demandas populares[41]. Recentemente, ele deu declarações sobre a urgência de tais demandas, mas também acenou em direção ao mercado ao articular para que um antigo adversário, Geraldo Alckmin, seja seu vice-presidente[42]. Nota-se que ele se coloca mais uma vez como o artificie da conciliação de classes.

No entanto, o atual momento histórico tem suas especificidades[43], que mostram o quanto é delicada a conciliação. As margens para confrontar o neoliberalismo hoje são menores, devido a   elementos criados nos governos Temer e Bolsonaro, como a independência do Banco Central e o Teto de Gastos. Os jornais analisados, assim como boa parte da grande mídia provavelmente estará pressionando pela manutenção deles: os ataques que sofreram de Bolsonaro não abalam o compromisso de décadas e os interesses empresariais com a agenda neoliberal.

Acresce a presença da extrema-direita organizada com relevante lastro social. Ela faz ameaças ao processo eleitoral e vai continuar atuando em um possível governo Lula. Todos esses fatores tiveram sua participação e crescimento com o colapso da conciliação de classes anterior, que retirou de forma traumática o PT do poder. Portanto, são várias as dificuldades e é muito difícil a conciliação no horizonte do governo petista.

Contudo, mesmo com as dificuldades apontadas, a imagem de um governo Lula como o amanhecer de um tempo melhor é muito forte, como se nota nas intenções de voto que beiram uma vitória em primeiro turno. Ela se fundamenta no contraste entre dois elementos: a lembrança de uma época recente e singular de crescimento da economia e redução da desigualdade social em comparação com o presente, marcado pelo desamparo diante da pandemia de coronavírus, empobrecimento, mais desigualdade e constantes ameaças à democracia.
 

 

[1] FREJAT, Roberto. QUENTAL, Dulce. O Poeta está vivo. Interprete: Barão Vermelho. IN: Barão Vermelho. Na Calada da Noite. Rio de Janeiro: WEA, 1990. Disponível em: https://music.youtube.com/watch?v=mNxgsgmkoHc&feature=share. Acesso em 21 jan 2022.

[2] Feriado que não comemora nenhum fato histórico ou religioso, mas apenas o próprio calendário. Essa reflexão foi retirada de um editorial: ANO Novo. Folha de S. Paulo, ano 82, n. 26936, 1/1/2003, Primeiro Caderno, pp.2

[3] Supondo que a eleição ocorra e seu resultado seja respeitado, visto que Jair Bolsonaro deu várias declarações desacreditando as eleições com voto eletrônico. Ele afirmou que ocorreria no Brasil algo pior do que nos EUA. Lá, apoiadores de Trump invadiram o Congresso, quando Biden iria ser diplomado como presidente. CARVALHO, Daniel. TEIXEIRA, Matheus. “Se Brasil não tiver voto impresso em 2022, vamos ter problema pior que os EUA, diz Bolsonaro.” Folha de S. Paulo. Brasília, 7 jan 2021. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/01/se-brasil-tiver-voto-eletro…. Acesso em 14 jan 2022.

[4] Ver o início do comentário de José Roberto de Toledo sobre as pesquisas de intenção de voto à presidente divulgadas em dezembro de 2021 entre os minutos 13 e 19 do Podcast Foro de Teresina. FORO DE TERESINA “181: O duopólio das intenções de voto e suas alianças.” Locução de: Fernando de Barros e Silva, José Roberto de Toledo e Thais Bilenky. Revista Piauí; Rádio Novelo, 17 dez 2021. Podcast. Disponível em: https://open.spotify.com/episode/7GdGKwempVmR0fE2k3xpJA. Acesso em: 13 jan 2022.

[5] YAHYA, Hanna. “Grandes jornais mantém circulação nos primeiros 2 anos de Bolsonaro.” Poder 360. 25 jan 2021. Disponível em: https://www.poder360.com.br/midia/grandes-jornais-mantem-circulacao-nos-2-primeiros-anos-de-bolsonaro/. Acesso em 13 mar 2021.

[6] FRANÇA, Vinícius Sales do Nascimento. A Folha de S. Paulo e os protestos pelo   impeachment de Collor. 2015. 102f. Dissertação (Mestrado em História Social) – Faculdade de Formação de Professores, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, São Gonçalo, 2015. Disponível em: https://bdtd.ibict.br/vufind/Record/UERJ_7694de9a8ad6ffbd9aeae12f1b8b0c5e. Acesso em 20/1/2022.

[7] ACERVO Folha de S Paulo. Desenvolvido por Digital Pages e Grupo Folha. Disponível em: http://acervo.folha.com.br/. ACERVO O Globo. Infoglobo Comunicação e Participações. Disponível em: https://acervo.oglobo.globo.com/ 

[8] SEVCENKO, Nicolau. “O rosto do mundo.” IN: Primeira página: Folha de S. Paulo. 6ª edição. São Paulo: Publifolha, [1985] 2006, pp.9.

[9] Seguindo a definição de Perseu Abramo sobre textos informativos e opinativos: “O reino da objetividade é a informação, a notícia, a cobertura, a reportagem, a análise, assim como o reino da tomada de posição é a opinião, o comentário, o artigo, o editorial” ABRAMO, Perseu. Padrões de Manipulação na Grande Imprensa. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003, pp.41.

[10] LATTMAN-WELTMAN. A Imprensa faz e desfaz um presidente: o papel da imprensa na ascensão e queda do fenômeno Collor. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994, pp. 107-108.

[11] Hoje a empresa de pagamentos online PagSeguro e o banco PagBank são muito importantes dentro dos negócios da família Frias, proprietária da FSP. Porém, em 2003, eles não existiam. Ver: CONHEÇA o grupo Folha. Folha de São Paulo, 2022. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/institucional/. Acesso em 20 jan 2022. HISTÓRIA - Sobre o UOL. UOL - Universo On Line, 2002. Disponível em: https://sobreuol.noticias.uol.com.br/historia/. Acesso em 20 jan 2022. SOBRE o Pagseguro. Pagseguro, 2022. Disponível em: https://pagseguro.uol.com.br/sobre/. Acesso em 20 jan 2022.

[12] FATO RELEVANTE. UOL, 4/1/2005. Disponível em:  http://sobre.uol.com.br/ultnot/noticias/2005/01/04/ult2800u4.jhtm. Acesso em 20 jan 2022. PERFIL - Grupo Folha. Meios no Brasil, 2015. Disponível em:  http://www.meiosnobrasil.com.br/?page_id=769. Acesso em 20 jan 2022.

[13] GRUPO Globo. Grupo Globo, [s/d]. Disponível em: https://grupoglobo.globo.com/. Acesso em 21 jan 2022.

[14] Nos dias correntes, também se destaca o serviço de streaming GloboPlay. Além disso, em 2019, o grupo se associou a Stone Pagamentos e também passou a atuar no setor de meios de pagamentos, concorrendo com a PagSeguro. ROSA, Bruno. “Grupo Globo e Stone se unem no setor de maquininhas de cartão.” O GLOBO ECONOMIA. 30/7/2019. Disponível em: https://oglobo.globo.com/economia/grupo-globo-stone-se-unem-no-setor-de-maquininhas-de-cartao-23843792. Acesso em 20 jan 2022.

[15] PACETE, Luis Gustavo. “Globo e Folha criaram ícone econômico.” Meio e Mensagem, 13/9/2016. Disponível em: https://www.meioemensagem.com.br/home/midia/2016/09/13/globo-e-folha-cr…. Acesso em 20 jan 2022.

[16] COUTINHO, Calos Nelson. Gramsci. Porto Alegre: L&PM, 1981. GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.

[17] BRAUDEL, “História e ciências sociais - a longa duração”. IN: Escritos sobre História. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1996.

[18] Depois de Juscelino Kubitschek terminar seu mandato em 1961, passaram-se 61 anos e 17 pessoas pela Presidência da República. Somente Lula e FHC terminaram seus mandatos e passaram a faixa para um sucessor também eleito democraticamente.

[19] Apenas como breve comparação, 16 anos depois o editorial que comentou o início do governo Bolsonaro (que já era hostil ao jornal desde a campanha eleitoral em 2018), chamava-se” Esperanças e anseios”. O nome é próximo do editorial de 2003, porém o governo Lula inspirava temor e o governo Bolsonaro, inimigo declarado do jornal, apenas anseios, preocupações.

[20] O editorial destaca que esse número somente é inferior ao que Regan recebeu nos EUA em 1984 na história das eleições.

[21] FONSECA, Francisco Cesar Pinto da. O Consenso Forjado: A Grande Imprensa e a formação da agenda Ultraliberal no Brasil. São Paulo: Editora Hucitec, 2005.

KUCINSKI, Bernardo. A síndrome da antena parabólica: Ética no jornalismo brasileiro. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 1998.

[22] ALMEIDA, Gelsom Rozentino de. História de uma década quase perdida. PT, CUT, Crise e Democracia no Brasil: 1979-1989. Rio de Janeiro: Garamond, 2011.

[23] NORONHA, Eduardo. “A Explosão das greves na década de 80.” IN: BOITO JR et al. O sindicalismo brasileiro nos anos 80. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991.

[24] SECCO, Lincoln. História do PT: 1978-2010. Cotia-SP: Ateliê Editorial, 2011.

[25] FERNANDES, Florestan. Nova República? Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1986.

[26] VERSIANI, Maria Helena. Linguagens da cidadania: os brasileiros escrevem para a Constituinte de 1987/1988. Tese (Doutorado em História, Política e Bens Culturais) - FGV - Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2013.

[27] ALMEIDA, op. Cit.

[28] ANDERSON, Perry. “Balanço do neoliberalismo.” In: SADER, Emir; GENTILI, Pablo (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995, pp. 9-23.

HOBSBAWM, E. J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: No loop da montanha russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

[29] É importante destacar que ao passar de doutrina para projeto, para uma agenda de governo em execução, o neoliberalismo assume características próprias que estão adequadas com a formação social em que ele está se instalando. FILGUEIRAS, Luiz. “O neoliberalismo no Brasil: estrutura, dinâmica e ajuste do modelo econômico.”  Neoliberalismo y sectores dominantes. Tendencias globales y experiencias nacionales. Basualdo, Eduardo M.; Arceo, Enrique. CLACSO, Buenos Aires. Agosto 2006

[30] Produtos de origem agropecuária e mineral de baixa ou nenhuma industrialização como soja, carne bovina, frango, celulose, petróleo bruto e minério de ferro – alguns dos principais produtos exportados pelo Brasil. A ascensão do modelo neoliberal está ligada a um processo de desindustrialização e dependência das exportações de commodities e da entrada de capitais pelo mercado financeiro. Nesse sentido, a economia brasileira é marcada por elementos que estão presentes desde o início da colonização portuguesa, determinando o sentido da criação da sociedade colonial brasileira: o papel de exportador de commodities para economias capitalistas centrais (como açúcar, ouro e café, em diversos momentos da história do Brasil). A permanência desse papel pode ser ligada ao conceito braudeliano de estrutura: realidades multisseculares que marcam de forma profunda as sociedades. BRAUDEL, op. cit. PRADO JÚNIOR, Caio. “Sentido da Colonização”. IN: Formação do Brasil contemporâneo: colônia. 22. ed. São Paulo: Brasiliense, 1992.

[31] FILGUEIRAS, op. Cit.

[32] SECCO, op. cit.

[33] Palocci perdeu o cargo por ter se envolvido na quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa. Ele relatou para a Comissão Parlamentar de Inquérito dos Bingos ter visto Palocci frequentar uma casa em que lobistas se reuniam para obter vantagens em ações do governo.

[34] Nesses anos, houve um resultado ruim, a recessão de 0,9% em 2009. Porém, ela foi compensada pelo forte crescimento em 2010, de 7,5%.

[35] CARVALHO, Laura Barbosa de. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018.

[36] Cabe destacar as críticas aos governos petistas. Algumas áreas como a preservação do meio ambiente e o cuidado com as comunidades indígenas ficaram aquém das expectativas; e a desapropriação de terras urbanas ligadas à Copa das Confederações (2013) e a Copa do Mundo (2014), geraram conflitos com comunidades populares. Além disso, mesmo após a revelação das tramas entre juiz e acusação na Operação Lava Jato, é notável que os sucessivos escândalos de corrupção, desde o primeiro mandato, fizeram que a direita se fortalecesse. Ela retomou uma pauta anticorrupção que tem eco popular desde antes de 1964, como demonstra a eleição de Jânio Quadros. A longo prazo, isso favoreceu o desmonte das conquistas dos governos do PT. FAUSTO, Ruy. Caminhos da esquerda - elementos para uma reconstrução. São Paulo, Cia das Letras, 2017.

[37] NITAHARA, Akemi. “Extrema pobreza e desigualdade crescem há 4 anos, revela pesquisa.” Agência Brasil, 6/11/2019. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-11/extrema-pobre…. Acesso em 21 jan 2022.

[38] ALVARENGA, Dalan. “Brasil tem a 4ª maior taxa de desemprego do mundo, aponta ranking com 44 países.” G1, 22/11/2021. Disponível em https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/11/22/brasil-tem-a-4a-maior-…. Acesso em 21 jan 2022. “DESEMPREGO.” IBGE, 2021. Disponível em https://www.ibge.gov.br/explica/desemprego.php. Acesso em 21 jan 2022.

[39] “INFLAÇÃO”. IBGE, 2021. Disponível em https://www.ibge.gov.br/explica/inflacao.php

Acesso em 21 jan 2022.

[40] PELLEGRINI, Aline. “Qual o quadro de insegurança alimentar no Brasil da pandemia.” Nexo Jornal, 13/4/2021. Disponível em https://www.nexojornal.com.br/expresso/2021/04/13/Qual-o-quadro-de-inse…. Acesso em 21 jan 2022.

[41] No dia 19/1/2022, Lula falou sobre a necessidade de governar levando em conta os interesses de negros, índios, desempregados e catadores de material reciclável, não apenas os do mercado financeiro. LULA: 'Faria Lima e Bolsa de Valores têm de aprender que há outros setores'. UOL Economia, 19/1/2022. Disponível em:  https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2022/01/19/lula-faria-lima…. Acesso em 21 jan 2022.

[42] Entrevista realizada pela FSP com um analista de uma casa de investimentos da Bolsa de Valores de São Paulo indica que a chapa com Alckmin sugere um governo pautado na responsabilidade fiscal, espelhando o que ocorreu em 2002. CASTRO, José de. “Com Alckmin vice de Lula, podemos ter governo mais pragmático, diz economista da Rio Bravo.” Folha de S. Paulo, 20/1/2022. Disponível em:  https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/01/com-alckmin-vice-de-lula-…. Acesso em 21 jan 2022.

[43] É oportuno se posicionar contra a ideia de repetição histórica, nem sequer como uma alegoria. Me refiro ao trecho de Marx, frequentemente mal interpretado: “Em alguma passagem de suas obras, Hegel comenta que todos os grandes fatos e todos os grandes personagens da história mundial são encenados, por assim dizer, duas vezes. Ele se esqueceu de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Marx não afirma que há repetição histórica. O autor ironiza Hegel e os personagens da política francesa em 1851, cujos gestos remetem a outros feitos no processo da Revolução Francesa, de 1789 a 1815 (que, por sua vez, se viam repetindo a República Romana).  Penso que a repetição é incoerente com a concepção da história baseada na luta de classes. A relação entre os seres humanos e a riqueza se reparte em inúmeros gestos que retornam no dia a dia, mas que nunca são exatamente iguais. Nem o conjunto dos seres humanos de uma sociedade é o mesmo – em qualidade e quantidade – em outro ponto do tempo, nem será igual o universo de objetos de trabalho, nem as relações ligadas ao trabalho e à acumulação. A marcha das forças materiais não retorna a um ponto anterior. MARX, Karl. O 18 de Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011. p. 25.

 


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