Ano 3 nº 01/2022: Mundo acadêmico - Sobre o Livro de Friedrich List: Sistema Nacional da Economia Política (1845) - Karl Marx

boletim2-01


Mundo acadêmico ...

 

SOBRE O LIVRO DE FRIEDRICH LIST: SISTEMA NACIONAL DA ECONOMIA POLÍTICA (1845)[1]

 

Karl Marx

Tradução de Fernando Sarti Ferreira

 

List_marx

Colagem de Antonio B. Canellas

 

1. CARACTERÍSTICAS GERAIS DE LIST

 

(...)a consciência [certeza] da morte da burguesia já penetrou até mesmo a consciência do burguês alemão ao ponto de ele ser inocente o suficiente para admitir para si mesmo esse “trise fato”:

“Por isso é tão triste quando se quer fazer valer os males de que a indústria está acompanhada nos nossos dias como motivos para rejeitar a própria indústria. Existem males muito maiores do que uma classe de proletários: cofres vazios, impotência nacional, servidão nacional, morte da nação”[2] (p. lxvii)

É muito mais triste que o proletariado já exista, já faça exigências e já inspire medo antes mesmo que a burguesia alemã tenha desenvolvido sua indústria. No que concerne ao proletariado, certamente ele estará feliz com sua situação social quando a burguesia reinante tiver o tesouro público repleto e a unidade nacional[3]. O senhor List fala apenas sobre o que é mais triste para a burguesia. E nós admitimos que é muito triste que ela queira estabelecer o domínio da indústria precisamente quando a servidão da maioria, resultante dela, já é um fato de conhecimento geral. A burguesia alemã é o engenhoso fidalgo que queria introduzir a cavalaria errante justamente quando a polícia e o dinheiro já eram uma realidade

3. Um grande inconveniente (obstáculo) que afeta a burguesia alemã em seus esforços em busca da riqueza industrial é o seu idealismo, professado até os dias de hoje. Como é possível que este povo do espírito [Geist], de repente, encontre a suprema dádiva da humanidade no calicô[4], no fio têxtil, na spinning mule[5], na horda de escravos fabris, no materialismo da maquinaria, nas bolsas cheias de dinheiro dos donos de fábricas? Chegou a época em que o idealismo vazio, superficial e sentimental da burguesia alemã, sob o qual está escondido o mais insignificante, sujo e covarde espírito de dono de mercearia, deve necessariamente revelar seu segredo. Mas ele o revela novamente de uma maneira verdadeiramente alemã e extravagante. Ele o revela com uma vergonha idealista-cristã. Ele repudia a riqueza enquanto luta por ela. Ele se disfarça de um materialismo desalmado idealizado e somente aí se arrisca a persegui-lo.

Toda a parte teórica do sistema de List não é outra coisa senão um disfarce em uma fraseologia idealista do materialismo industrial da economia real. Em toda parte, ele deixa a coisa existir, mas idealiza sua expressão. Nós vamos seguir essa trilha em detalhe. É esta fraseologia idealista e vazia que lhe permite ignorar as reais barreiras que se entrepõem no caminho de seus desejos pios e dar vazão às suas mais absurdas fantasias (o que teria sido das burguesias inglesa e francesa se elas, em primeiro lugar, tivessem pedido permissão para a alta nobreza, a distinta burocracia e as antigas dinastias para introduzir a “indústria” pela “força da lei”?).

A burguesia alemã é religiosa até mesmo quando é industrial. Ela se esquiva de falar sobre o desagradável valor de troca que cobiça e fala sobre forças produtivas; ela se esquiva de falar da concorrência e fala da confederação nacional das forças produtivas; ela se esquiva de falar de seus interesses privados e fala dos interesses nacionais. Quando se observa o clássico e franco cinismo com o qual as burguesias inglesa e francesa, representadas – pelo menos no começo de sua dominação – pelos seus porta-vozes científicos da economia política, endeusaram a riqueza e sacrificaram tudo por este Moloque[6], inclusive a ciência, e por outro lado, quando notamos a maneira idealizada, fraseológica e bombástica do senhor List, que em meio a economia política despreza a riqueza do “homem justo” e reconhece objetivos mais elevados, deve-se achar “também triste” que o dia de hoje não seja mais um dia para a riqueza. 

O senhor List sempre fala em molossos[7]. Em uma retórica desajeitada e verborrágica, ele continuamente exibe as águas turbulentas em que navega e que sempre o levam a um banco de areia, cuja essência consiste em uma constante repetição sobre tarifas protecionistas e as verdadeiras fábricas alemãs. Ele é constantemente sensível e suprassensível.

O filisteu idealista alemão que queira ser rico deve, em primeiro lugar, é claro, criar para ele mesmo uma nova teoria da riqueza; uma teoria que faça a riqueza ser digna de sua luta por ela. O burguês na França e na Inglaterra veem a aproximação da tempestade que irá destruir na prática o que tem sido chamado concretamente até hoje de riqueza. Mas o burguês alemão, que ainda nem chegou perto desta riqueza inferior, tenta dar uma nova interpretação “espiritual” para ela. Ele cria para si mesmo uma economia política “idealizada”, que não tem nada em comum com a profana Economia Política francesa e inglesa, para justificar para si e para o mundo que também quer ficar rico. O burguês alemão começa a sua criação de riqueza com a criação de uma economia política extravagante e hipocritamente idealizada.  

4. Como o senhor List interpreta a história e qual a sua atitude perante Smith e sua escola.

Humilde como é o senhor List em relação à nobreza, às antigas dinastias governantes e à burocracia, ele é, no mesmo grau, “audacioso” em sua oposição à Economia Política inglesa e francesa, da qual Smith é o protagonista e que teria cinicamente traído o segredo da “riqueza”, tornando impossível todas as ilusões sobre a sua natureza, tendência e movimento. O senhor List mistura todos eles, chamando-os de “A Escola”. Pois, uma vez que a burguesia alemã está preocupada com tarifas protecionistas, todo o desenvolvimento da Economia Política desde Smith não tem, é claro, qualquer significado para ele, porque todos os seus representantes mais destacados pressupõem a atual sociedade burguesa de concorrência e livre comércio.

O filisteu alemão revela aqui o seu caráter “nacional” de diversas formas.

1) Em toda a Economia Política, ele vê apenas sistemas econômicos concebidos em universidades. Que o desenvolvimento de uma ciência como a Economia Política esteja ligada ao movimento real da sociedade, ou seja até mesmo sua expressão teórica, o senhor List, é claro, não suspeita. Um teórico alemão. 

2) Já que seu próprio trabalho (teórico) esconde um objetivo secreto, ele suspeita de objetivos secretos por todos os lados                                   

Sendo um verdadeiro filisteu alemão, o senhor List, ao invés de estudar a história real, busca o segredo, as más intenções dos indivíduos e, graças à sua astúcia, ele é muito bom para descobri-los (confundi-los). Ele faz grandes descobertas, como a que Adam Smith queria iludir a todos com sua teoria e que o mundo inteiro deixou-se ser iludido até que o grande senhor List o despertou de seu sonho, do mesmo jeito que um certo Conselheiro de Justiça de Düsseldorf descobriu que a história de Roma havia sido inventada pelos monges medievais para justificar a dominação de Roma

Porém, assim como o burguês alemão não conhece melhor maneira de se opor a um inimigo do que ofendendo-o moralmente, lançando calúnias sobre seu estado de espírito e buscando má fé em suas ações, em outras palavras, atacando sua reputação e transformando o indivíduo em objeto de suspeição, assim o senhor List também calunia os economistas ingleses e franceses e dissemina fofocas sobre eles. E assim como o filisteu alemão não desdenha do mais mesquinho e fraudulento lucro no comércio, o senhor List não perde tempo em manipular as citações que ele faz para torná-las mais lucrativas. Ele não se importa de colar o rótulo de seu concorrente nos seus próprios produtos de péssima qualidade, com a intenção de desacreditar o seu rival por meio da falsificação ou até mesmo de inventar as mentiras mais descaradas para aviltá-lo.

Nós daremos alguns exemplos do modo de proceder do senhor List.

É notório que os padres alemães acreditavam que não poderiam causar maior dano ao Iluminismo do que nos contando aquela estúpida e mentirosa anedota de que, em seu leito de morte, Voltaire teria renunciado suas ideias. O senhor List, da mesma forma, nos leva ao leito de morte de Adam Smith e nos informa que foi verificado que Smith não teria sido sincero em seus ensinamentos. No entanto, escutemos o próprio senhor List e seu veredito posterior sobre Smith. Colocamos ao lado das palavras de List as da fonte de sua sabedoria.

 

List: [Das nationals System der politischen Oekonomie. Erster Band. Der internationale Handel, die Handelspolitik und der deutsche Zollverein, Stuttgart e Tubingen, 1841]

Ferrier, F.L.A., Du gouvernement considéré dans ses rapports avec le commerce, Paris 1805

“Eu tinha recordado da biografia de Dugald Stewarts, como este grande espírito não conseguira morrer em paz até que todos os seus manuscritos tivessem sido queimados, com o que eu queria dar a entender, quão premente era a suspeição de que estes papéis pudessem ter contido provas contra a sua sinceridade (p. 77)”

“Eu tinha provado como [...] sua teoria tinha sido usada pelos ministros ingleses, para deitar areia aos olhos de outras nações a favor da Inglaterra” (Ibidem)

“A doutrina de Adam Smith, no que respeita às condições nacionais e internacionais, é uma mera continuação do sistema fisiocrata. Como este, ignora a natureza das nacionalidades [...] [e] pressupõe a paz eterna e a união universal” (p.555)

“Será possível que ao acumular tantos argumentos falsos a favor do livre comércio, Smith estivesse agindo de boa fé?... O objetivo secreto de Smith era semear na Europa princípios que ele sabia muito bem que dariam ao seu país o mercado do universo” (p.385-386)

“Até se pode pensar que Smith nem sempre tenha professado a mesma doutrina; e de que outra forma se pode explicar os tormentos que sofreu no leito de morte com medo de que os manuscritos de suas conferências sobrevivessem?” (p. 386)

Ele [Ferrier] condena Smith por ter sido um commissaire des douanes [Comissário de Aduana] (p. 388)

Agora, Smith quase sempre raciocinava como os economistas” (fisiocratas), “sem considerar a diferença entre os interesses das nações e a suposição de que existe apenas uma sociedade de homens no mundo” (p. 381)

“Deixemos de lado todos esses projetos de união” (p. 15).

 

A Economia Política de J.B. Say é interpretada pelo senhor List como uma especulação fracassada. Apresentaremos a seguir o seu veredito categórico sobre a vida de Say. Mas antes de prosseguirmos, apenas mais um exemplo de como List plagia outros autores e, ao copiar, os falsifica para atingir os seus oponentes.

 

List[8]

Pecchio, Histoire de l'économie politique en Italie, etc. Paris, 1830[9].

“Say e McCulloch parecem não ter visto ou lido mais que o título deste livro” [o livro de Antônio Serra de Nápoles]; “ambos o põe elegantemente de lado com a observação de que se tratava apenas do dinheiro e que já o título provava que o autor tinha incorrido no erro de considerar os metais preciosos os únicos objetos de riqueza” (p.456)

“os estrangeiros não se importavam, ou queriam tirar de Serra o mérito de ter sido o primeiro fundador dos princípios desta ciência [Economia Política]. Esta minha observação não diz respeito ao Sr. Say que, embora culpe erroneamente o Sr. Serra por não considerar como riqueza nada além de moedas de ouro e prata, com generosa franqueza, lhe concede a glória de ter sido o primeiro a apontar o poder produtivo da indústria... Minha reclamação é dirigida ao senhor McCulloch... Se o senhor McCulloch tivesse lido um pouco mais que o título [do livro de Serra” (p. 76-77)

   

Qualquer um pode ver como o senhor List deliberadamente falsifica Pecchio, de quem ele copia o trecho para desacreditar o senhor Say. Não menos falsa é a informação biográfica que ele nos dá sobre Say:

“Primeiro comerciante, depois fabricante, depois político acidentado, Say agarra a economia política como se agarra uma nova empresa quando a antiga já não quer funcionar... O ódio ao Sistema Continental, que lhe destruiu a fábrica, e ao seu autor, que o baniu do Tribunato, destinaram-no a abraçar o partido do comércio livre absoluto” (p. 488-489)[10].

Então Say apoiou o sistema de livre comércio porque sua fábrica foi arruinada pelo Sistema Continental! Mas se ele tivesse escrito seu Traité d’économie politique [1803] antes de ter sido dono de uma fábrica? Say transformou-se um defensor do sistema de livre comércio porque Napoleão o expulsou do Tribunato[11]! Mas se ele tivesse escrito o seu livro enquanto ele era um tribuno? E se Say, que de acordo com o senhor List era um homem de negócios fracassado que viu na literatura apenas um ramo de negócios, tivesse desde sua juventude desempenhado um importante papel no mundo literário francês?

Onde o senhor List obteve essas informações novas? Foi do Notas sobre a vida e obra de J.B. Say, de Charles Comte[12], publicado como introdução do livro de Say Curso Completo de Economia Política. O que esse texto nos diz? Justamente o contrário de tudo o que List diz. Vejamos:

“O pai de J.B. Say, que era um comerciante, pretendia que o filho se envolvesse com o ofício. No entanto, sua inclinação o levou para a literatura. Em 1789 ele publicou um panfleto em nome da liberdade de imprensa. Desde o início da Revolução, ele contribuiu para o jornal Courrier de Provence, publicado por Mirabeau. Ele também trabalhou no escritório do Ministro Clavière. Sua inclinação ‘para as ciências morais e políticas’, assim como a falência de seu pai, fez com que ele desistisse completamente do comércio e fizesse da atividade científica sua única ocupação. Em 1794 ele se tornou editor-chefe do La Décade philosophique, littéraire et politique. Em 1799, Napoleão o nomeou como membro do Tribunato. Em seu tempo livre enquanto era tribuno, ele costumava trabalhar em seu Traité politique, publicado em 1803. Ele foi demitido do Tribunato, pois Say pertencia aos poucos que ousaram se opor [a Napoleão]. Lhe foi oferecido um posto lucrativo no departamento de finanças, mas ele recusou, apesar de charge de six enfants et n’ayant presque point de fortune [sobrecarregado com seis filhos quase sem fortuna] ... já que ele não seria capaz de cumprir com as funções do posto oferecido sem participar da implementação de um sistema que ele tinha condenado como desastroso para a França. Ele preferiu abrir uma fábrica de fiação de algodão”.

Se o senhor List baseia a difamação de J.B. Say em falsificação, não é outro o caso dos elogios que List outorga ao irmão, Louis Say. Para provar que Louis Say compartilha de sua astuta[13] visão, List falsifica uma passagem do autor.

O senhor List afirma na p. 484[14]:

“Na sua opinião [Louis Say], a riqueza das nações não consiste em bens materiais e no seu valor de troca, mas na capacidade de produzir estes bens constantemente”.

De acordo com o senhor List, as palavras seguintes são do próprio Louis Say[15]:

O Luis Say do senhor List

O verdadeiro Louis Say

“A riqueza não consiste nas coisas que satisfazem nossas necessidades ou gostos, mas na possibilidade de desfrutá-las anualmente”.

“A riqueza não consiste nas coisas que satisfazem nossas necessidades ou gostos, mas na renda ou na possibilidade de desfrutá-las anualmente”

Desta forma, Say não está falando da capacidade de produzir, mas na de desfrutar; na capacidade que provê a “renda” (revenu) de uma nação. Da desproporção entre o crescimento da força produtiva e da renda da nação como um todo, e de todas as suas classes em particular, surgiram justamente as mais hostis teorias ao senhor List como, por exemplo, as de Sismondi e Cherbuliez.

Deixe-nos agora dar um exemplo da ignorância do senhor List em seu veredito sobre a “Escola”. Ele diz sobre Ricardo (List sobre as forças produtivas):

“De qualquer forma, desde A. Smith, a Escola não tem sido feliz com as suas investigações sobre a natureza da renda. Ricardo e depois dele Mill, MacCulloch e outros são da opinião de que a renda está a pagar a capacidade produtiva natural inerente aos terrenos. O primeiro baseou um sistema inteiro nesta opinião... Mas como tinha na mente apenas as condições inglesas, caiu na opinião errônea de que os campos e prados ingleses, por cuja suposta produtividade natural atualmente se pagam tão bonitas rendas, tinham sempre sido os mesmos campos e prados” (p. 360)[16]

Ricardo diz:

“Se o excedente de produção que a terra oferece sob a forma de renda fosse uma vantagem, seria desejável que todos os anos as máquinas recentemente construídas fossem menos eficientes que as antigas, pois isso daria, sem dúvida alguma, um maior valor de troca aos produtos manufaturados... do país; pagava-se então uma renda a quem possuísse as máquinas mais eficientes. A renda aumenta rapidamente à medida que a terra disponível perde suas capacidades produtivas. A riqueza aumenta mais rapidamente naqueles países... onde, graças aos progressos na agricultura, a produção se pode multiplicar sem aumento da quantidade relativa de trabalho e onde, em consequência, é lento o crescimento da renda”. (Ricardo, Principles of Political Economy, etc. Paris, 1835, Vol. 1, pp. 77 e 80-82.)[17]

De acordo com a teoria de Ricardo, a renda, longe de ser consequência da produtividade natural inerente ao solo, é muito mais a consequência do constante crescimento da baixa produtividade do solo, uma consequência da civilização e do crescimento populacional. De acordo com Ricardo, enquanto as terras mais férteis estiverem disponíveis em quantidades ilimitadas, não haverá renda da terra. Logo, a renda da terra é determinada pelo tamanho da população em relação à quantidade de terras disponíveis.

A teoria de Ricardo, que serve como base teórica para toda Anti-Corn Law League e do movimento anti-renda dos estados livres da América do Norte[18], teve de ser falsificada pelo senhor List – assumindo que ele tenha mais do que um conhecimento de orelhada sobre o tema – nem que seja porque prova quão pouco os “livres, poderosos e ricos burgueses” estão inclinados a trabalhar “diligentemente” pela “renda da terra” e para trazer para eles [os proprietários de terra] o mel da colmeia[19]. A teoria de Ricardo sobre a renda da terra não é nada mais que a expressão econômica da luta de vida e morte da burguesia industrial contra os proprietários de terra.

O senhor List nos instruí um pouco mais sobre Ricardo da seguinte forma:

“Atualmente, a Teoria do valor de troca caiu em tal impotência... que Ricardo... podia dizer: “A tarefa principal da economia política é estabelecer as leis segundo as quais o rendimento do solo distribuído por proprietários, arrendatários e trabalhadores”. (p. 493)[20]

As observações necessárias deste ponto serão feitas no lugar apropriado.

5. O senhor List atinge o auge da infâmia em seu veredito sobre Sismondi:

List:

Sismondi

“Ele [Sismondi] quer, por exemplo, que o espírito de inventor seja controlado!” (p. xxxix)

“Minhas objeções não são dirigidas às máquinas, às invenções ou à civilização, mas apenas à moderna organização da sociedade, que priva os trabalhadores de qualquer propriedade que não seja suas mãos e que não dá para ele nenhuma garantia contra a competição, da qual ele inevitavelmente será uma vítima. Suponha que todo mundo disponha de maneira igualitária do produto do trabalho por eles realizado, assim toda e qualquer invenção técnica será, em todos os casos possíveis, uma benção para todos eles”. (Nouveaux principies d’économie politique, Paris, 1827, t. II, p. 433.

Enquanto o senhor List lança aspersões morais contra Smith e Say, ele só pode explicar a teoria do senhor Sismondi a partir dos defeitos corporais deste último:

“Von Sismondi vê com os seus olhos físicos tudo que é vermelho como sendo preto; o seu olhar mental nas questões da economia política parece padecer do mesmo erro” (p. xxix)[21]

Para que possamos apreciar de maneira completa a vilania deste impostor, é preciso conhecer a passagem da qual o senhor List derivou sua observação. Sismondi afirma em seu Études sur l’économie politique, quando ele trata da devastação da Campanha Romana:

“As ricas cores da Campanha Romana... escapam dos nossos olhos, para os quais o raio vermelho não existe” (p. 6). Brussels reprint, 1838 [Vol. II].    

Sismondi explica isto dizendo: “o encanto que atraí os viajantes para Roma” foi para ele destruído e por isso ele agora “têm olhos que estão ainda mais abertos para ver a real e miserável condição de vida dos habitantes da Campanha”.

Se Sismondi não viu os tons de rosa do céu que magicamente iluminam toda (fábrica) indústria para o senhor List, ele pôde ver o galo vermelho no telhado destas fábricas. Teremos mais tarde uma oportunidade para [examinar] o veredito de List de que:

“as publicações político-econômcias de Dimonde de Sismondi, reconhecido historiador, não têm, em relação ao comércio internacional e à política comercial, qualquer valor” [p. xxix].

Enquanto o senhor List explica o sistema de Smith a partir de sua vaidade pessoal e da obscura mentalidade de comerciante britânico; o sistema de Say pelo seu desejo de vingança e como um empreendimento comercial, no caso de Sismondi ele desce tão baixo a ponto de explicar o sistema de Sismondi a partir de seus defeitos físicos.  

 

[5] 4. A ORIGINALIDADE DO SENHOR LIST

 

É muito característico do senhor List que, apesar de toda sua pompa, ele não tenha apresentado uma única proposição que não tenha sido feita bem antes dele, não só pelos defensores do sistema proibitivo [protecionismo], mas também por autores da “Escola” que ele inventou – se Adam Smith é o ponto de partida teórico da economia política, então seu ponto de chegada, sua verdadeira escola, é a sociedade civil [die bürgeliche Gesellschaft], cujas diferentes fases de desenvolvimento podem ser precisamente traçadas pela economia política. Apenas as ilusões e a linguagem (frases) idealizadas pertencem ao senhor List. Consideramos importante chamar a atenção do leitor para este tedioso trabalho e dar uma prova detalhada disso. Ele derivará disso sua convicção de que o burguês alemão entrou em cena post festum; que é tão impossível contribuir para o avanço da economia política, exaustivamente desenvolvida pelos ingleses e franceses, quanto provavelmente seria para eles contribuírem com qualquer coisa nova para o desenvolvimento da filosofia na Alemanha. O burguês alemão pode apenas incorporar suas ilusões e frases à realidade francesa e inglesa. Mas assim como ele pouco pode contribuir para um novo desenvolvimento da economia política, é ainda mais impossível para ele conseguir um novo avanço prático na indústria a partir do já quase exausto desenvolvimento das fundações atuais da sociedade.  

A partir de agora restringiremos nossa crítica à parte teórica do livro de List, mas sobretudo às suas principais descobertas.

Quais são as principais proposições que List quer provar?

Vamos nos debruçar sobre seus principais objetivos.

1) O burguês quer do Estado tarifas protecionistas para poder colocar suas mãos sobre o seu poder e riqueza. Mas desde que [na Alemanha], diferentemente da Inglaterra e da França, ele não tem o poder do Estado a sua disposição e, como consequência, não pode usá-lo como ele gostaria, mas apenas recorrendo às petições, é necessário em sua relação com o Estado que a atividade (modo de ação) que ele quer controlar para seu próprio benefício, sua demanda, seja retratada como uma concessão que ele dá ao Estado, quando [na realidade], ele demanda concessões do próprio Estado. A partir daí, por meio do senhor List, ele [o burguês alemão] prova para o Estado que sua teoria difere de todas as outras, já que ela permite a interferência e controle do Estado nas indústrias, que ela tem em mais alta conta a sabedoria econômica do Estado e que ela apenas pede para que se use ao máximo esta sabedoria sob a condição, é claro, de se limitar à promoção de “fortes” tarifas protecionistas.

2) O burguês [Bürger] quer ficar rico, ganhar dinheiro; mas ao mesmo tempo, ele deve chegar a um acordo com o atual idealismo do público alemão e de sua própria consciência. Assim, ele tenta provar que não aspira por bens materiais iníquos, mas por uma essência espiritual, por uma infinita força produtiva, ao invés dos vis e finitos valores de troca. É claro que essa essência espiritual envolve uma circunstância na qual o “cidadão” [“Bürger”] aproveita esta oportunidade para encher os seus bolsos com ordinários valores de troca.

6) Como o burguês agora tem a esperança de enriquecer principalmente por meio de “tarifas protecionistas”, e como as tarifas protecionistas podem enriquecê-lo na medida em que não vão enriquecer os ingleses,  ele explorará seus compatriotas, na verdade até mais do que foram explorados a partir do exterior, e como as tarifas protecionistas exigem o sacrifício de valores de troca dos consumidores (principalmente de trabalhadores que serão substituídos por máquinas e de todos aqueles que recebem uma renda fixa, como funcionários e arrendadores de terra etc.), o burguês  industrial tem que provar que, longe de desejar bens materiais, ele não quer outra coisa além do sacrífico dos valores de troca, dos bens materiais, por uma essência espiritual. Fundamentalmente, portanto, é apenas uma questão de sacrifício pessoal, de asceticismo, de grandeza cristã da alma. É um mero acidente que A faça o sacrifício, mas que B o coloque no bolso. O burguês alemão é muito altruísta para pensar a respeito de seu ganho privado e que acidentalmente esteja ligado àquele sacrifício. Mas se a classe cujo burguês acredita necessitar para sua emancipação não pode se alinhar com essa teoria espiritual, essa teoria deve ser abandonada e, ao contrário da “Escola” [que defende a liberdade de comércio], precisamente a teoria dos valores de troca deve ser trazida à cena.

3) Uma vez que, em essência, o maior desejo da burguesia equivale a elevar o sistema fabril ao nível da prosperidade “inglesa” e transformar o industrialismo no regulador da sociedade, i.e., de promover a desorganização da sociedade, o burguês tem de provar que sua única preocupação é a harmonização de toda a produção social e a organização da sociedade. Ele restringe o comércio exterior por meio de tarifas protecionistas, enquanto a agricultura – ele sustenta- alcançará rapidamente sua maior prosperidade devido à indústria manufatureira. A organização da sociedade, portanto, se resume nas fábricas. Elas são as organizadoras da sociedade e o sistema de competição que elas trazem à existência é a melhor confederação da sociedade[22]. A organização da sociedade que o sistema fabril cria é a verdadeira organização da sociedade.   

A burguesia está provavelmente correta em conceber, em geral, os seus interesses como idênticos, assim como o lobo, sendo um lobo, tem interesses idênticos aos dos seus companheiros lobos, por mais que seja em nome do interesse de cada lobo individual que ele, e não outro lobo, pule sobre a presa.

6. Finalmente, é característico da teoria do senhor List, assim como de toda a burguesia alemã, que para defender seus desejos de exploração, ela é levada a todo momento a apelar a frases “socialistas” e, assim, forçosamente manter uma ilusão que já foi refutada há muito tempo. Mostraremos em inúmeras passagens que as frases do senhor List são comunistas, se levadas às suas últimas consequências. Nós, é claro, estamos longe de acusar alguém como o senhor List e sua burguesia alemã de comunismo, mas isso nos oferece novas provas da fraqueza interna, falsidade e hipocrisia infame da “boa natureza” e do “idealismo” da burguesia. Isso nos prova que o idealismo dele, na prática, não é nada mais que o disfarce inescrupuloso e impensado de um materialismo repulsivo.

Por fim, é sintomático que a burguesia alemã comece pela mentira com a qual às burguesias francesa e inglesa terminam – depois de atingir uma posição onde elas são levadas a pedir desculpas por elas mesmas, pela sua própria existência.

 

7. Como o senhor List distingue a atual economia política, ostensivamente cosmopolita, da sua própria economia, nacional-política, pelo fato da primeira ser baseada em valores de troca e a segunda nas forças produtivas, nós devemos começar por essa teoria. Além disso, partindo do princípio de que a confederação das forças produtivas supostamente representa a unidade da nação, nós também examinaremos está outra tese, antes da distinção mencionada acima. Essas duas teses formam a base real da economia nacional [de List] como distinta da economia política.  

Nunca deve ter ocorrido ao senhor List que a real organização da sociedade é um materialismo sem alma, um espiritualismo individual – o individualismo. Nunca deve ter ocorrido a ele que os economistas políticos apenas deram ao estado das coisas na sociedade uma expressão teórica correspondente. Caso contrário, ele teria de dirigir sua crítica a atual organização da sociedade e não aos economistas políticos. Ele os acusa de não terem encontrado qualquer expressão de beleza para uma realidade sombria. Logo, ele procura deixar essa realidade da forma que ela é e apenas muda as expressões desta. Em nenhum momento ele crítica a sociedade real, mas, como um verdadeiro alemão, ele crítica a expressão teórica desta sociedade e a reprova por expressar a coisa real e não uma noção imaginária da coisa real.

A fábrica é transformada em uma deusa, a deusa do poder de fabricar.

O dono da fábrica é o sacerdote deste poder.

 

[7] 2. A TEORIA DAS FORÇAS PRODUTIVAS E A TEORIA DOS VALORES DE TROCA 

 

1) A teoria das “forças produtivas” do senhor List limita-se às seguintes proposições:

a) As origens da riqueza são uma coisa completamente diferente da riqueza em si; A força de produzir riqueza é, por isso, imensamente mais importante do que a riqueza em si (p. 201)[23]

b) List está longe de rejeitar a teoria da economia cosmopolita; ele apenas tem a opinião de que a economia política deveria também ser desenvolvida cientificamente (p.187)[24];

c) Qual seria então a origem do trabalho?...O que será que fazem estas cabeças e estas mãos e pés produzir e o que é que torna eficiente estes esforços? Que outra coisa poderá ser se não o espírito que anima os indivíduos, a ordem social que fecunda suas atividades, as forças da natureza de que podem dispor? (p. 205)[25]

6) Smith “seguiu o caminho errado, de explicar as forças intelectuais pelas condições materiais” (p. 207)[26]

7) “A ciência que ensina como as forças produtivas são criadas e cultivadas e como são oprimidas ou destruídas (ibid)[27]

8) Um exemplo de distinção entre dois pais de família, Religião Cristã, monogamia etc. (pp.208-209)[28]

9) “É possível determinar os conceitos de valor e capital, lucro, salário, renda da terra, dissolvê-los nas suas partes, especular sobre os elementos que possam influenciar a sua subida, descida etc., sem nisso levar em conta as situações políticas das nações (p.211)[29]

Transição

10) Oficinas e fábricas são a mãe e a filha da liberdade científica (cívica) (p.212)[30]

11) A teoria das classes produtivas e não produtivas. A primeira produz valores de uso, a segunda produz força produtiva (p. 215)[31]

12) Comércio exterior não deve ser julgado apenas do ponto de vista da teoria dos valores (p. 216)[32]

13) A nação deve sacrificar forças materiais para poder adquirir forças espirituais ou sociais. Tarifas protecionistas para manufaturas nascentes, por exemplo. (pp. 216-217)[33]

14) “Por isso, se por causa das tarifas alfandegárias protetoras se realizar um sacrifício de valores, este mesmo sacrifício será compensado pela aquisição de uma força produtiva que assegura à nação não só uma soma imensamente maior de bens materiais para o futuro, mas também independência industrial em caso de guerra” (p. 217)[34]

15) “Relativamente a tudo isto, no entanto, a maioria depende de das condições da sociedade em que o indivíduo foi formado e se move, depende se ciência e artes estão a florir” (p. 206)[35]

2) O senhor List é tanto uma presa para os preconceitos econômicos da antiga economia política – até mais, como poderemos ver, do que outros economistas da “Escola” – que para ele “bens materiais” e “valores de troca” coincidem completamente. Porém, o valor de troca é totalmente independente da natureza específica dos “bens materiais”. O valor de troca cai quando a quantidade de bens materiais aumenta, embora ambos, antes e depois, tenham a mesma relação com as necessidades humanas. O valor de troca não está ligado à qualidade. As coisas mais úteis, como o conhecimento, não têm valor de troca. O senhor List deveria, portanto, ter compreendido que a conversão de bens materiais em valores de troca é o resultado do sistema social existente, do desenvolvimento da sociedade da propriedade privada. A abolição do valor de troca é a abolição da propriedade privada e da apropriação privada. O senhor List, por outro lado, é tão ingênuo que admite, por meio da teoria dos valores de troca, que:

“É possível determinar os conceitos de valor e capital, lucro, salário, renda da terra, dissolvê-los nas suas partes, especular sobre os elementos que possam influenciar a sua subida, descida etc., sem nisso levar em conta as situações políticas das nações (p.211)[36]

Consequentemente, sem levar em conta a “teoria das forças produtivas” e a “condição política das nações”, tudo isso pode ser “determinado”. O que pode ser determinado dessa forma? A Realidade. O que é determinado, por exemplo, pelos salários? A vida do trabalhador. Além disso, é determinado desse modo que o trabalhador é o escravo do capital, que ele é uma “mercadoria”, um valor de troca, de maior ou menor nível e que sua queda ou aumento depende da competição, da oferta e da demanda; é determinado, desse modo, que sua atividade não é a livre manifestação da vida humana, quer dizer, é antes a venda a retalho de suas forças, a alienação (venda) para o capital de suas capacidades unilateralmente desenvolvidas, em uma palavra, “trabalho”. Muitos se esquecem disso. “Trabalho” é a base viva da propriedade privada, é a propriedade privada como a fonte criativa de si mesma. Propriedade privada não é nada além de trabalho corporificado. Se há o desejo de se fazer um ataque mortal à propriedade privada, deve-se atacá-la não apenas materializada, mas também como atividade, como trabalho. É um dos maiores equívocos falar de trabalho livre, humano ou social, sem falar do fim da propriedade privada. “Trabalho”, por sua própria natureza, é uma atividade não-livre, inumana e antissocial, determinado e criado pela propriedade privada. Por isso a abolição da propriedade privada irá se transformar numa realidade somente quando ela for concebida como a abolição do “trabalho” (uma abolição que, evidentemente, só foi possível graças ao próprio trabalho, ou seja, que se tornou plausível como resultado da atividade material da sociedade e que de forma nenhuma deve ser entendida como a substituição de uma categoria por outra)[37]. Uma “organização do trabalho”, portanto, é uma contradição. A melhor organização que pode ser dada ao trabalho é a atual, a livre concorrência, a dissolução de toda a sua organização pretérita aparentemente “social”.  

Dessa maneira, se os salários podem ser determinados pela teoria dos valores [de troca], se é assim “determinado” que o próprio homem é um valor de troca, que a esmagadora maioria das pessoas nas nações constituem uma mercadoria e que pode ser determinada sem levar em conta “as situações políticas das nações”, o que é que tudo isto prova senão que esta esmagadora maioria das pessoas [no interior destes países] não deve levar em conta “as situações políticas”; que estas “situações” são uma pura ilusão; que uma teoria que se afunda neste sórdido materialismo, transformando a maioria das pessoas das nações em uma mercadoria, em um “valor de troca”, e que submete esta maioria às condições totalmente materiais do valor de troca, é uma hipocrisia infame e idealista, quando, em relação a outras nações, despreza o “mau materialismo” dos “valores de troca” e só se preocupa de maneira ostensiva com as “forças produtivas”. Além do mais, se as condições do capital, renda da terra etc. podem ser “determinadas” sem levar em conta as “situações políticas” das nações, o que isso prova a não ser que o capitalista industrial e o arrendador são guiados em suas ações na vida real pelo lucro, valores de troca, e não por considerações sobre “condições políticas” e “forças produtivas”, e quando eles falam de civilização e forças produtivas é apenas uma forma de embelezar sua visão de mundo estreita e egoísta?

O burguês diz: É claro que a teoria dos valores de troca não deve ser eliminada no nosso país; a maioria da nação deve permanecer como mero “valor de troca”, como uma mercadoria, que possa encontrar seu próprio comprador. Uma mercadoria que não é vendida, mas que vende a si mesma. Em relação a vocês, proletários, e mesmo em nossas relações mútuas, nós nos consideramos como valores de troca. Aqui, a lei da barganha universal continua valendo. Mas em relação aos outros países, nós devemos interromper o funcionamento desta lei. Como uma nação, nós não podemos barganhar nós mesmos com outras nações. Desde que a maioria das pessoas nos países foram submetidas às leis da barganha “sem levar em conta” as “condições políticas das nações”, essa proposição não poder ter outro significado que: Nós, burgueses alemães, não queremos ser explorados pela burguesia inglesa da maneira como vocês, proletários alemães, são explorados por nós e como nós nos exploramos uns aos outros. Nós não queremos nos submeter às mesmas leis do valor de troca com as quais nós submetemos vocês. Nós não queremos reconhecer mais fora do país as leis econômicas que defendemos dentro dele.

O que quer o filisteu alemão? Ele quer ser burguês, um explorador, dentro de seu país, mas ele não quer ser explorado fora dele.  Ele ensoberbece-se em ser a nação em relação aos países estrangeiros e diz: eu não me submeto às leis da competição; isso vai contra minha dignidade nacional; e como eu sou a nação, eu sou um ser superior à barganha.

A nacionalidade do trabalhador não é a francesa, a inglesa ou a alemã, ela é o trabalho, a escravidão livre e a barganha de si. O governo dele tão pouco é francês, inglês ou alemão, é o capital. O seu ar nativo não é francês, alemão ou inglês, é o ar da fábrica. A terra que lhe pertence não é francesa, inglesa ou alemã, ela fica alguns metros abaixo do solo. Dentro do país, o dinheiro é a pátria do industrial. Por isso o filisteu alemão quer que as leis da competição, do valor de troca, da barganha, percam sua força nas barreiras alfandegárias de seu país! Ele está disposto a reconhecer o poder da sociedade burguesa somente quando este poder está de acordo com seus interesses, os interesses de sua classe!? Ele não quer ser vítima em seu próprio país de um poder para o qual ele quer sacrificar os outros e a si mesmo. Fora de seu país ele quer se mostrar e ser tratado como um ser diferente do que ele é e se proteger de como ele se comporta em seu próprio país! Ele quer deixar a causa existir e se livrar de um de seus efeitos! Vamos lhe provar que vender-se dentro do país tem com consequência necessária vender-se fora, que a competição, que lhe dá poder dentro do país, não pode prevenir seu enfraquecimento fora do país; que o Estado, que ele subordina à sociedade burguesa dentro do país, não pode proteger ele da ação da sociedade burguesa fora do país.

Por mais que o indivíduo burguês lute contra outros, como uma classe, ele tem interesses em comum e essa comunidade de interesses, que é direcionada contra o proletário dentro do país, é direcionada contra a burguesia de outras nações. É isso que o burguês chama de nacionalidade.

2) Contudo, é possível considerar a indústria a partir de um ponto de vista completamente diferente do sórdido interesse barganhador, como hoje em dia é considerado não apenas pelo mercador e industrial individual, mas também pelas nações manufatureiras e comerciantes. A indústria pode ser considerada como uma grande oficina onde o homem toma posse das forças humanas e naturais, objetivando-se e criando para si as condições da existência humana. Quando a indústria é considerada desta maneira, abstrai-se as circunstâncias nas quais ela opera hoje e em que ela existe como indústria; é o ponto de vista de quem não é da Era da indústria, mas que está acima dela; é a indústria considerada não pelo que ela é para o homem hoje, mas pelo que o homem de hoje é para a história humana, pelo que é historicamente; não é a sua existência atual (não é a indústria como ela é) que é reconhecida, mas sim o poder que ela tem sem saber ou sem querer e que destrói ou cria a base para a existência humana. (Defender que toda nação passa por este desenvolvimento interno seria um absurdo assim como a ideia de que toda nação deve ter o desenvolvimento político da França ou filosófico da Alemanha. O que as nações fizeram como nações, elas o fizeram para a sociedade humana; todo seu valor consiste apenas no fato de que cada uma das nações realizou em benefício de outras nações um dos principais aspectos históricos (uma das principais determinações) do quadro geral no qual a humanidade realizou o seu desenvolvimento e, por conseguinte, depois que a indústria na Inglaterra, a política na França e a filosofia na Alemanha foram desenvolvidas, estas o foram para o mundo, e o seu significado histórico mundial, como também o destas nações, chegou ao fim).

Essa compreensão sobre a indústria é, ao mesmo tempo, o reconhecimento de que chegou a hora de acabar com ela ou de superar as condições materiais e sociais dentro das quais a humanidade desenvolveu suas capacidades como um escravo. Pois tão logo a indústria não seja dominada por interesses mesquinhos, mas pelo desejo de desenvolvimento do homem; quando o homem, ao invés do interesse mesquinho, é tomado como princípio, o que na indústria só pode se desenvolver em contradição com a própria indústria, dá-se numa base harmônica com o que deve ser desenvolvido.

Mas o indivíduo miserável que [em suas ideias] permanece dentro do sistema atual, que deseja apenas elevar [a indústria] a um nível que seu país ainda não atingiu e que olha com enorme inveja outra nação que já atingiu esse nível – tem esse indivíduo miserável o direito de ver na indústria outra coisa que não interesses mesquinhos? Ele tem o direito de dizer que está preocupado unicamente com o desenvolvimento das capacidades humanas e do controle sobre as forças da natureza? Pois isso é tão vil quanto o feitor de escravos que se vangloriava de chicotear seus escravos para que eles tivessem o prazer de exercitar seus músculos. O filisteu alemão é o feitor que usa o chicote das tarifas protecionistas para incutir em sua nação o espírito da “educação industrial”[38] e ensiná-la como exercitar o poder dos seus músculos.   

A escola de Saint-Simon nos deu um exemplo instrutivo do que acontece se à força produtiva, criada pela indústria inconscientemente e contra a sua vontade, é dado o crédito pela indústria de hoje e se as duas se confundem: indústria e as forças [produtivas] que ela dá à luz inconscientemente e contra a sua vontade, mas que apenas se tornam forças humanas, poder dos homens, quando a indústria for abolida. Isso é tanto absurdo como se o burguês quisesse levar o crédito por sua indústria ter criado o proletariado e, portanto, pela nova ordem mundial criada pelo proletariado. As forças da natureza e sociais que a indústria dá à luz (conjura) têm a mesma relação com a burguesia que o proletariado. Hoje eles ainda são escravos do burguês, e neles não vê nada a não ser os instrumentos (portadores) de sua luxúria suja (egoísta) pelo lucro; amanhã eles irão romper as suas correntes e se revelarão como portadores do desenvolvimento dos seres humanos e que o destruirá com a sua indústria, da qual assumirá apenas essa casca externa suja – que eles consideram sua essência – até que o núcleo humano tenha ganhado foça suficiente para quebrá-la e se apresentar em sua própria forma. Amanhã elas romperão as correntes pelas quais os burgueses as separam dos homens e assim as distorce (transforma) de um verdadeiro lastro social em grilhões da sociedade.

A escola de Saint-Simon glorificou em lisonjas a força produtiva da indústria. Ela misturou as forças produtivas que a indústria deu à luz com a indústria em si, ou seja, com as condições hoje existentes que as indústrias fornecem para essas forças. Nós estamos longe de colocar os Saint-simonianos no mesmo nível de alguém como List ou o filisteu alemão. O primeiro passo para quebrar o feitiço lançado sobre a indústria foi abstrair das condições – dos grilhões do dinheiro – em que estas forças da indústria operam hoje e examinar estas em si mesmas. Este foi o primeiro chamado aos homens para emancipar a sua indústria da mesquinharia e para compreender a indústria atual como uma época de transição. Os Saint-simonianos, além disso, não pararam nessa interpretação. Eles foram além – atacaram o valor de troca, a propriedade privada, a organização atual da sociedade. Eles colocaram a associação no lugar da competição. Mas eles foram punidos por esse erro original. A confusão acima mencionada não só os levou à ilusão de ver os sujos burgueses como padres, mas os fez também, após os primeiros debates, caírem numa antiga ilusão (confusão) – mas agora de maneira hipócrita, precisamente porque no decurso da luta, a contradição entre as duas forças que eles haviam confundido se tornou manifesta. A glorificação da indústria (das forças produtivas da indústria) se transformaram na glorificação da burguesia e os senhores Michael Chevalier, Duveyrier, Dunoyer, penduraram a si mesmos e a burguesia no tronco aos olhos de toda a Europa – depois que os ovos podres que a história jogou em seus rostos se transformaram pela magia da burguesia em ovos de ouro -, já que o primeiro dos acima citados reteve as antigas frases, mas as dotou com o conteúdo do atual regime burguês; o segundo está engajado em falcatruas no atacado e preside a venda de jornais franceses, enquanto o terceiro tornou-se o mais raivoso apologista da sociedade atual, superando em desumanidade (sem nenhuma vergonha) todos os economistas ingleses e franceses anteriores. O burguês alemão e o senhor List começam onde a escola de Saint-Simon parou – com hipocrisia, falsidade e frases vazias.

A tirania industrial da Inglaterra sobre o mundo é a dominação da indústria sobre o mundo. A Inglaterra nos domina porque a indústria nos domina. Nós podemos nos livrar do domínio da Inglaterra se nos livrarmos do seu domínio industrial em nossa casa. Nós só conseguiremos colocar um fim na dominação inglesa na esfera da competição se nos superarmos a competição dentro de nossas fronteiras. A Inglaterra tem poder sobre nós porque nós fizemos da indústria um poder sobre nós.

3)  Que a ordem social industrial é o melhor dos mundos para o burguês, a ordem mais adequada para desenvolver suas “habilidades” como um burguês e a capacidade de explorar a natureza e as pessoas – quem irá discordar dessa tautologia? Quem irá discordar que hoje em dia tudo que é chamado de “virtude”, seja individual ou social, é uma fonte de lucro para a burguesia? Quem irá discordar que o poder político é um meio para o seu enriquecimento e que até a ciência e os prazeres intelectuais são seus escravos? Quem irá discordar disso? Que para ele, tudo está excelentemente [adaptado...]? Que para ele, que tudo se transformou em meios de riqueza, em uma “força produtiva de riqueza”?

4)  A moderna economia política surgiu a partir do sistema social de concorrência. A mão-de-obra livre, ou seja, a escravidão indireta que se oferece para venda, é o seu princípio. Suas principais premissas são a divisão do trabalho e a máquina. E estas só podem se desenvolver plenamente apenas nas fábricas, como a própria economia política moderna admite. Assim, a economia política de hoje tem, a partir das fábricas, o seu princípio criativo. Ela pressupõe as condições sociais dos dias de hoje. Portanto, não precisa discorrer sobre a “força manufatureira”[39].

Se a “Escola” não fez qualquer “elaboração científica[40] da teoria das forças produtivas separada e ao lado da teoria dos valores de troca, ela assim o fez porque tal separação é uma abstração arbitrária; porque é impossível e não pode levar a lugar algum que não a frases genéricas.

5) “As origens da riqueza são uma coisa completamente diferente da riqueza em si; A força de produzir riqueza é, por isso, imensamente mais importante do que a riqueza em si” (p. 201)[41]

A força produtiva aparece como uma entidade infinitamente superior ao valor de troca. Essa força reivindica a posição de essência interior, enquanto o valor de troca o de fenômeno passageiro. A força aparece como infinita, o valor de troca como finito; o primeiro como imaterial, o segundo como material – e nós encontramos todas estas antíteses no senhor List. Por isso o mundo sobrenatural das forças toma o lugar o do mundo material dos valores de troca. Enquanto a baixeza de uma nação que se sacrifica por valores de troca, de pessoas que são sacrificadas por coisas, é algo bastante óbvio, as forças, por outro lado, parecem essências espirituais independentes – fantasmas – e personificações puras, divindades. E afinal de contas, pode-se muito bem exigir do povo alemão que ele sacrifique os malvados valores de troca por fantasmas! Um valor de troca, o dinheiro, são sempre vistos como um objetivo externo, mas as forças produtivas parecem ser uma finalidade que surge da minha própria natureza, um objetivo em si mesmo. Assim, o que eu sacrifico em forma de valores de troca é algo externo a mim; o que eu ganho em forma de forças produtivas é o meu auto-ganho – É assim que as coisas se parecem se alguém se satisfaz com as palavras ou, como o alemão idealista, não se preocupa com a realidade suja que está por detrás destas palavras grandiloquentes.

Para destruir o brilho místico que envolve a “força produtiva”, basta consultar qualquer livro de estatística. Aí se lê sobre energia hídrica, energia a vapor, mão-de-obra, cavalos de potência. Tudo isso são “forças produtivas”. É de grande apreço o homem figurar como “força” ao lado de cavalos, vapor e água?

Sob o sistema atual, se uma coluna torta, membros torcidos, o desenvolvimento e fortalecimento unilateral de certos músculos etc., tornam você mais capaz para o trabalho (mais produtivo), então sua coluna torta, seus membros torcidos, seus movimentos musculares unilaterais são uma força produtiva. Se a sua vacuidade espiritual é mais produtiva do que uma abundante atividade intelectual, então sua vacuidade espiritual é uma força produtiva etc., etc. Se a monotonia de uma ocupação o torna mais adequado para essa ocupação, então a monotonia é uma força produtiva.

O burguês, o dono da fábrica, está preocupado de alguma forma com o desenvolvimento de todas as habilidades do trabalhador, exercitando as suas capacidades produtivas, realizando-se como ser humano e, ao mesmo tempo, realizando sua natureza humana?

Deixaremos a resposta para o Píndaro inglês do sistema fabril, o senhor Ure:

“O objetivo e a tendência constante de toda a melhoria da maquinária é, de fato, dispensar completamente o trabalho humano, ou para diminuir o seu preço, substituindo a indústria das mulheres e das crianças pela do trabalhador adulto; ou o trabalho dos trabalhadores brutos pelo do artesão habilidoso” (Philosophie des manufactures etc., Paris, 1836, t. I, p.34). “A fraqueza da natureza humana é tal que quanto mais hábil for o trabalhador, mais obstinado e intratável ele se torna e, consequentemente, menos provável que faça parte de um sistema mecânico... “O grande objetivo do fabricante atual é, portanto, ao combinar a ciência com o seu capital, reduzir a tarefa dos seus trabalhadores ao exercício da sua vigilância e destreza” (op. cit., t. 1, p. 30).

 

Força, Força Produtiva, Causas

 

“As origens da riqueza são uma coisa completamente diferente da riqueza em si”

Mas se o efeito é diferente da causa, não deveria a natureza do efeito já estar presente na causa? A causa já deve carregar em si a característica determinante que se manifestará depois no efeito. A filosofia do senhor List vai até ao ponto de saber que causa e efeito são coisas “bastante diferentes”.

“A força capaz de criar riqueza é infinitamente mais importante que a riqueza em si”

É um belo reconhecimento do homem o que o rebaixa a uma “força” criadora de riqueza!  O burguês não vê no proletariado um ser humano, mas uma força capaz de criar riqueza, uma força que, além disso, ele possa comparar com outras forças produtivas – um animal, uma máquina – e se a comparação se mostrar desfavorável para o homem, a força humana deve dar lugar à força de um animal ou máquina, embora nesse caso o homem ainda tenha (goza) a honra de figurar como uma “força produtiva”.

Se eu caracterizo o homem como um “valor de troca”, nessa expressão já está implícito que as condições sociais o transformaram em uma “coisa”. Se eu o trato como uma “força produtiva”, eu coloco outro sujeito no lugar do verdadeiro, eu o substituo por outra pessoa, e ele existe agora apenas como causa da riqueza.

Toda a sociedade humana se transforma em uma mera máquina para a criação de riqueza.

A causa não é de forma alguma superior ao efeito. O efeito é apenas a causa expressa.

List finge que está exclusivamente preocupado pelas forças produtivas por si mesmas, para além dos malvados valores de troca.

Alguma clareza já temos sobre a essência das “forças produtivas” nos dias de hoje pelo fato delas consistirem não só em, por exemplo, tornar o trabalho do homem mais eficiente ou as forças naturais e sociais mais eficazes, mas também em tornar o trabalho mais barato ou mais improdutivo para o trabalhador. Daí que a força produtiva seja, desde o início, determinada pelo valor de troca. É igualmente um aumento de... 

 

[3. DO CAPÍTULO TRÊS. O PROBLEMA DA RENDA DA TERRA]

 

...[22] a renda da terra desaparece. Estes preços mais altos dos grãos – já que, por mais caro que seja, o trabalhador sempre consome uma certa quantidade de grãos e, portanto, seu salário nominal aumenta mesmo quando na realidade diminui – devem ser deduzidos dos lucros industriais; Ricardo é esperto o bastante para entender que os salários não podem ser mais comprimidos. Assim, quando há um aumento no preço do grão, segue-se uma redução nos lucros e um aumento dos salários, sem que estes últimos aumentem na realidade. Contudo, o aumento do preço dos grãos provoca também o aumento dos custos de produção dos industriais, deixando a acumulação e a competição entre eles mais difícil. Em uma palavra, paralisa a força produtiva do país. Consequentemente, o malvado “valor de troca”, que entra no bolso dos proprietários de terra sob a forma de renda da terra, sem nenhuma vantagem (com maior prejuízo) para a força produtiva do país, deve, de uma forma ou de outra, ser sacrificada para o bem geral – por meio do livre comércio de grãos, transferindo todos os impostos sobre a renda da terra, ou sobre sua apropriação direta, ou seja, sobre a propriedade da terra, pelo Estado (a essa conclusão chegaram, entre outros, [James Mill], Hilditch e Cherbuliez).

O senhor List, é claro, não se atreveu a dizer à aristocracia alemã sobre essas terríveis consequências da força produtiva industrial para a propriedade da terra. Por isso, ele desmascarou Ricardo, - que havia revelado tais verdades desagradáveis -  e lhe atribuiu a visão oposta, a dos fisiocratas, segundo a qual a renda da terra não é nada mais do que a prova da força produtiva natural da terra, e o falsifica.

List:

Ricardo:

“De qualquer forma, desde A. Smith, a Escola não tem sido feliz com as suas investigações sobre a natureza da renda. Ricardo e depois dele Mill, MacCulloch e outros são da opinião de que a renda está a pagar a capacidade produtiva natural inerente aos terrenos. O primeiro baseou um sistema inteiro nesta opinião... Mas como tinha na mente apenas as condições inglesas, caiu na opinião errônea de que os campos e prados ingleses, por cuja suposta produtividade natural atualmente se pagam tão bonitas rendas, tinham sempre sido os mesmos campos e prados” (p. 360)[42]

“Se o excedente de produção que a terra oferece sob a forma de renda fosse uma vantagem, seria desejável que todos os anos as máquinas recentemente construídas fossem menos eficientes que as antigas pois isso daria, sem dúvida alguma, um maior valor de troca aos produtos manufaturados... do país; pagava-se então uma renda a quem possuísse as máquinas mais eficientes. A renda aumenta rapidamente à medida que a terra disponível perde suas capacidades produtivas. A riqueza aumenta mais rapidamente naqueles países... onde, graças aos progressos na agricultura, a produção se pode multiplicar sem aumento da quantidade relativa de trabalho e onde, em consequência, é lento o crescimento da renda”. (Ricardo, Principles of Political Economy, etc. Paris, 1835, Vol. 1, pp. 77 e 80-82.)[43]

  

Portanto, em relação à alta nobreza, o senhor List não ousa manter seu teatro de sombras sobre as “forças produtivas”. Ele quer seduzir essa nobreza com “valores de troca” e, portanto, difama a Escola de Ricardo, pois ela não julga a renda da terra do ponto de vista da força produtiva, nem esta última do ponto de vista do moderno sistema de fábricas.

Desta maneira, o senhor List é duplamente mentiroso. No entanto, não devemos cometer uma injustiça com ele sobre esse assunto. Uma grande fábrica Württemberg (Köchlin, se não estivermos enganados) tem a participação do próprio Rei [Wilhelm I] de Württemberg, que investiu uma enorme soma de dinheiro nela. Nas fábricas de Württemberg, e em maior ou menor medida também naquelas de Baden, a aristocracia fundiária tem um importante papel como acionistas. Aqui, portanto, a nobreza participa monetariamente da “força manufatureira”, não como proprietária de terra, mas como burguesia e fabricante, e...

[24] “forças produtivas” e a “continuidade e permanência da produção” de toda uma geração emerge – como List, o comunista disfarçado, ensina tão bem – e, portanto, é uma característica da geração e não dos senhores industriais (ver, por exemplo, Bray[44]).

Na Inglaterra, a maior renda da terra era garantida aos latifundiários somente por meio da ruína dos arrendatários e pela redução dos trabalhadores agrícolas ao nível dos pobres irlandeses (verdadeiros mendigos). Tudo isso apesar das várias Leis dos Cereais e à parte do fato que os latifundiários que recebiam rendas eram frequentemente obrigados a permitir aos arrendatários a remissão da metade para um terço da renda total. Desde 1815, três diferentes Leis dos Cereais foram aprovadas com o intuito de encorajar e melhorar a posição dos arrendatários[45]. Durante esse período, cinco comissões parlamentares foram nomeadas para investigar o estado e as causas da miséria na agricultura. De um lado, a continua ruína dos arrendatários, a despeito da mais completa exploração dos trabalhadores rurais e da redução extrema dos seus salários, e do outro lado, a necessidade frequente dos latifundiários de renunciar parte de sua renda, são as provas de que nem mesmo na Inglaterra – apesar de toda sua indústria manufatureira – foi produzida uma elevada renda da terra. Pois, do ponto de vista econômico, não se pode considerá-la como renda da terra quando uma parte dos custos de produção[46] é drenado, por meio de acordos e outras circunstâncias que se encontram fora da esfera da economia, para o bolso do latifundiário e não para o do arrendatário. Se o latifundiário cultivasse a sua própria terra, ele certamente teria receio de classificar parte do lucro ordinário do seu capital de giro sob o título de “renda da terra”.

Escritores dos séculos 16, 17 e até mesmo dos primeiros dois terços do século 18, ainda consideraram a exportação de cereais pela Inglaterra como sua principal fonte de renda. A velha indústria inglesa – cujo principal ramo era a indústria da lã e cujos menos importantes processavam a maior parte dos materiais fornecidos por ela – era totalmente subordinada à agricultura. Sua principal matéria prima era produto da agricultura inglesa. Como é óbvio, essa indústria promoveu a agricultura. Mais tarde, quando o sistema fabril se desenvolveu de maneira apropriada, começou-se a sentir rapidamente a necessidade de impostos aduaneiros sobre os grãos. Mas eles permaneceram nominais. O rápido crescimento da população, a abundância de terras férteis que ainda podiam ser cultivadas, as invenções, em um primeiro momento, como é lógico, também elevaram a agricultura. Ela foi beneficiada especialmente pela guerra contra Napoleão, que estabeleceu um sistema regular de proibição para ela. Mas 1815 revelou o quão pouco a “força produtiva” da agricultura havia crescido. Um protesto generalizado surgiu entre latifundiários e arrendatários e as atuais Leis dos Cereais foram promulgadas. É da natureza da moderna indústria, em primeiro lugar, afastar a indústria do solo nativo, já que essa processa principalmente matérias primas do exterior e se baseia no comércio exterior. Em segundo lugar, ela causa o crescimento da população numa proporção que, sob o sistema da propriedade privada, não corresponde à exploração do solo. É ainda da sua natureza, se ela consegue instituir as Leis dos Cereais, como tem feito na Europa até agora, converter os camponeses nos proletários mais pobres pela cobrança de elevadas rendas e pela adoção de métodos fabris para exploração fundiária. Por outro lado, caso se consiga impedir a aprovação das Leis dos Cereais, termina-se por colocar uma massa de terra fora do cultivo, sujeitando o preço dos grãos a contingências externas e expropria-se completamente o país, tornando dependente do comércio os seus meios de subsistência mais essenciais, o que prejudica a propriedade fundiária com uma fonte de propriedade independente. Esta última é a finalidade da Anti-Corn Law League e do movimento anti-renda na América do Norte, pois a renda da terra é a expressão econômica da propriedade da terra. Por isso os conservadores (Tories[47]) chamam continuamente a atenção para o perigo da Inglaterra se tornar dependente, de seus meios de subsistência, da Rússia, por exemplo.

A grande indústria – naturalmente, países como a América do Norte, que têm uma enorme quantidade de terra ainda a ser cultivada (e tarifas alfandegárias não têm como aumentar a extensão das terras) não contam aqui – certamente tem a tendência de paralisar a força produtiva do solo assim que esta tenha atingido determinado nível da mesma forma que, por outro lado, a condução da agricultura como uma fábrica tem a tendência de expulsar as pessoas e converter toda a terra – é claro, dentro de alguns limites – em pasto para que o gado tome o lugar das pessoas.

A teoria de Ricardo sobre a renda da terra se resume ao seguinte:

A renda da terra não adiciona nada à produtividade da terra. Pelo contrário, o aumento da renda da terra é prova de que a força produtiva da terra está caindo. Na verdade, ela é determinada pela relação entre a área adequada para o cultivo e o tamanho da população e o nível de desenvolvimento da civilização em geral. O preço do grão é determinado pelo custo de produção nas terras menos férteis que devem ser cultivadas por causa das necessidades da população. Se for preciso recorrer a terras de pior qualidade, ou se parcelas do capital tenham que ser aplicadas com menor rendimento no mesmo pedaço de terra, então o proprietário das terras mais férteis vende seus produtos tão caro quanto o camponês das mais inférteis. Ele embolsa a diferença entre o custo de produção na melhor terra e o da mais infértil. Assim, quanto menos produtiva que é usada para o cultivo, ou quanto menor o rendimento da segunda e terceira parcelas de capital aplicadas ao mesmo pedaço de terra, em suma, quanto mais a força produtiva relativa da terra diminui, maior é o aumento da renda da terra. A terra frutificou em todos os lugares...

 

4. O SENHOR LIST E FERRIER

 

O livro de Ferrier, subinspetor de alfândegas sob Napoleão, Du gouvernement considéré dans ses rapports avec le commerce, Paris, 1805, é o trabalho de onde o senhor List copiou. No livro de List não há uma única ideia básica que não esteja elaborada, e mais bem elaborada, no livro de Ferrier.

Ferrier foi um dos oficiais de Napoleão. Ele defendeu o Bloqueio Continental. Ele não fala do sistema de proteção, mas do sistema proibitivo. Ele está longe de cunhar frases sobre a união de todas as nações ou de paz eterna no país. Ou mesmo, é claro, tenha qualquer frase socialista. Devemos expor um pequeno trecho de seu livro para lançar luz sobre esta fonte secreta de sabedoria do senhor List. Enquanto o senhor List falsifica Louis Say para apresentá-lo como seu aliado, em nenhum lugar, por outro lado, ele cita Ferrier, a quem ele copiou em todos os lugares. Ele queria conduzir seu leitor por uma trilha falsa.

Já citamos o julgamento de Ferrier sobre Smith. Ferrier ainda adere ao antigo sistema proibitivo, mas de forma mais honesta.

 

Intervenção estatal. A economia das nações

 

“Existe, portanto, uma economia e uma prodigalidade das nações; mas uma nação é pródiga ou econômica somente em suas relações com outros povos” (p. 143)

“Não é verdade que o uso mais rentável do capital para o capitalista é também o mais favorável para a indústria... Longe dos interesses dos capitalistas estarem ligados ao interesse geral, eles estão quase sempre em oposição” (pp. 168-169)

“Há uma economia de nações, mas é muito diferente daquela de Smith... Consiste em comprar produtos estrangeiros somente na medida em que eles possam ser pagos por seus próprios produtos. Às vezes consiste em renunciar completamente a eles" (p. 174-175).

 

Forças produtivas e Valor de troca

 

“Os princípios da parcimônia das nações que Smith estabeleceu baseiam-se todos na distinção entre trabalho produtivo e improdutivo.... Esta distinção é essencialmente falsa... Não há trabalho improdutivo” (p. 141).

"Ele" (Garnier) "viu na prata apenas o valor da prata, sem pensar em sua propriedade, como prata, de tornar a circulação mais ativa e, consequentemente, multiplicar os produtos do trabalho" (p.18) “Portanto, quando os governos procuram impedir a saída de dinheiro ... isto não é por causa de seu valor... mas porque o valor que é recebido em troca não pode ter o mesmo efeito na circulação... porque não pode causar uma nova criação a cada transição”(pp.22-23) “A palavra 'riqueza', aplicada ao dinheiro que circula como dinheiro, deve ser entendida a partir dos atos de reprodução que facilita... e neste sentido um país se enriquece quando aumenta a quantidade de seu dinheiro, pois com este aumento de dinheiro todas as forças produtivas do trabalho aumentam” (p. 71) “Quando se diz que um país pode dispor (gastar) uma renda de dois milhões... o que se quer dizer é que o país tem os meios, com a ajuda desses dois milhões, para suportar uma circulação 10, 20, 30 vezes maior em valores ou, o que é a mesma coisa, que pode produzir esses valores. São estes meios de produção, que o país deve ao dinheiro, que são chamados de riqueza” (p.22).

Pode-se observar: Ferrier distingue o valor de troca que o dinheiro possuí da força produtiva do dinheiro. Além do fato de que ele em geral chama meios de produção de riqueza, em todo caso não havia nada mais fácil do que aplicar a todo capital a distinção que ele fez entre o valor e a força produtiva do dinheiro.

Mas Ferrier vai ainda mais longe, ele defende o sistema proibitivo, em geral com o argumento de que ele salvaguarda para as nações seus meios de produção:

“Assim, as proibições são úteis sempre que facilitam às nações a aquisição dos meios para satisfazer suas necessidades... Eu comparo uma nação que, com seu dinheiro, compra mercadorias no exterior que ela mesma pode produzir, embora de qualidade inferior, com um jardineiro que, insatisfeito com a fruta que colhe, compra frutas mais suculentas dos seus vizinhos, dando em troca suas ferramentas de jardinagem” (p. 288) “O comércio estrangeiro é sempre lucrativo quando ele impulsiona a produtividade do capital. Ele não é lucrativo quando, ao invés de multiplicar o capital, ele demanda sua alienação” (pp. 395-396)

 

Agricultura, Manufatura e Comércio

 

“Deve um governo promover o comércio e as fábricas em detrimento da agricultura? Essa ainda é uma daquelas questões sobre as quais governos e escritores não podem concordar” (p. 73)

“O progresso da indústria e do comércio está atado ao da civilização, das artes, das ciências e da navegação. Um governo, que praticamente não pode fazer nada pela agricultura, pode fazer quase tudo para a indústria. Se uma nação tem hábitos ou gostos capazes de impedir seu desenvolvimento, o governo deve usar todos os meios para combatê-los" (p. 84).

“A verdadeira forma de incentivar a agricultura é incentivando as manufaturas” (p.225). “O seu domínio” (o da indústria, pelo qual o Sr. Ferrier chama a indústria manufatureira) “não está limitado, seja em seus sucessos, seja em suas formas de melhoria... De longo alcance como é a imaginação, e como a imaginação, móvel e frutífera, seu poder criativo não tem outros limites além daqueles da própria mente humana, da qual recebe diariamente um novo brilho” (p. 85)

“A verdadeira fonte de riqueza de uma nação agrícola-manufatureira é a reprodução e o trabalho. Ela deve aplicar seu capital para esse fim e se preocupar em transportar e vender suas próprias mercadorias antes de poder vender e transportar as de outras nações” (p. 186) “Este crescimento da riqueza do homem deve ser atribuído principalmente ao comércio interno, que há muito precedeu o comércio entre nações” (p. 145) “De acordo com o próprio Smith, entre dois capitais, sendo que um é investido no comércio interno e o outro no externo, o primeiro dá à indústria do país 24 vezes mais suporte e encorajamento” (p. 145-146)

Mas o senhor Ferrier pelo menos entende que o comércio interno não pode existir sem o comércio externo:

“Se alguns indivíduos importam da Inglaterra 50.000 peças de veludo, eles ganharão muito dinheiro com esta transação e serão capazes de comercializar seus produtos. Mas eles reduziram a indústria doméstica e deixaram 10.000 trabalhadores sem trabalho” (p. 170; cf. pp. 155, 156).

Como List, o senhor Ferrier chama a atenção para a diferença entre cidades envolvidas com o comércio e a manufatura e aquelas que apenas consomem (p. 91), mas ao fazer isso ele pelo menos é honesto o suficiente para se referir à Smith. Ver também o comércio de transporte (p. 186 et passim).

A diferença entre Ferrier e List é que o primeiro escreve para apoiar um empreendimento de importância histórica mundial - o Bloqueio Continental -, enquanto o segundo para apoiar uma pequena burguesia, de mente fraca e mesquinha.

O leitor admitirá que todo o senhor List está contido in nuce nos extratos citados de Ferrier. Se, além disso, acrescentarmos as frases que ele toma emprestadas sobre o desenvolvimento da economia política desde Ferrier, então tudo o que resta como seu é a idealização vazia, cuja força produtiva consiste em palavras - e a hipocrisia esperta dos burgueses alemães aspirando pela dominação,

 

[1] Traduzido livremente do inglês a partir de Marx and Engels Collected Works, Volume 4, Lawerence & Wishart Eletric Book, 2010, p. 265-294.

[2] As citações feitas por Marx do livro de List foram retiradas da seguinte edição LIST, Friedrich. Friedrich List, Das nationals System der politischen Oekonomie. Erster Band. Der internationale Handel, die Handelspolitik und der deutsche Zollverein, Stuttgart e Tubingen, 1841. No corpo do texto manteremos as páginas citadas por Marx, enquanto nas notas de pé indicaremos a localização das citações em português retiradas de LIST, Friederich. Sistema Nacional da Economia Política. Trad. Eduardo de Sousa Ferreira e Karin Paul Ferreira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2006. Para a citação desta nota, ver a página 83 da referida edição [N.T.].   

[3] List foi um entusiasta da unificação alemã, sendo considerado por seus contemporâneos como o teórico da Zollverein (União Aduaneira Alemão) de 1834. A unificação de tarifas e da política econômica de boa parte dos Estados alemães foi um dos mais importantes passos para o processo de construção do Império alemão conduzido pelo Reino da Prússia e concluído em 1871 [N.T.].

[4] Tecido de algodão rústico produzido na região de Calicute, Índia [N.T.].

[5] Máquina usada para fiar algodão cujo papel na Revolução Industrial foi central [N.T.].

[6] Divindade adorada pelos antigos povos amonitas, mas que foi transformada em um demônio pela tradição judaico-cristã [N.T.].

[7] Tipo de pé métrico composto por três sílabas longas usado na poesia grega e latina. Marx usa o termo de maneira irônica para descrever o estilo pesado da escrita de List. 

[8] LIST, p. 537-538.

[9] A edição citada por Marx é Pecchio, Giuseppe. Histoire de l'économie politique en Italie, ou Abrégé critique des économistes italiens; précédée d'une introduction par le comte Joseph Pecchio. Trad. M. Léonard Gallois. Paris: A. Levavasseur, 1830. Para a tradução, cotejamos com a edição PECCHIO, Giuseppe. Storia della Economia Pubblica in Italia, ossia Epilogo degli economisti italiani. Lugano: Presfso. G. Ruggia e Comp., 1829, p. 61-62 [N.T.].

[10] LIST, p. 569

[11] O Tribunato foi uma das quatro instituições legislativas introduzidas na França pela Constituição de 1799, logo após o golpe do 18 brumário (10 de novembro) de 1799.  Esta instituição foi abolida em 1807.

[12] O Notice historique sur La vie et les ouvrages du J.B. Say foi o prefácio do sétimo volume do curso de Say sobre Economia Política, publicado logo após a sua morte sob o título de:  Cours comput d’économie politique pratique. Volume complimentaire. Milanges et correspondence d’économie politique; ouvrage posthume de J.B. Say, public par Charles Comte, son gendre, Paris, 1833. Marx cita resumidamente diferentes passagens das páginas iii-xii do “Notice historique” de Charles Comte.

[13] Marx faz um trocadilho com a palavra listig em alemão. Listig pode ser traduzida como “astuto”, mas pode ser também um adjetivo relativo à “List”.

[14] LIST, p. 564.

[15] List cita na nota 2, na página 565, a seguinte frase: “la richesse ne consiste pas dans les choses qui satisfont nos besoins ou nos goût, mais dans le pouvoir d’en jouir annuellement”. Na edição de 1836 de Études sur la Richesse des Nations de Louis Say, na verdade, pode-se ler a seguinte frase: “la richesse ne consiste pas dans les choses qui satisfont nos besoins ou nos goûts, mais dans le revenu ou dans le pouvoir d'en jouir annuellement”. [N.T.]

[16] LIST, p. 440-441.

[17] Para o trecho em português, ver RICARDO, David. Princípios de Economia Política e de Tributação. Trad. Maria Adelaide Ferreira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2005, p. 82-83 e 85-86.

[18] A Anti-Corn Law League foi um movimento fundado em 1838 pelos industriais de Manchester. A liga lutava pela abolição de uma série de leis que impunham tarifas elevadas à importação de cereais, buscando manter o preço destes produtos no mercado inglês.  Já em relação ao movimento “anti-renda” nos EUA, trata-se da National Reform Association, uma organização surgida naquele país na década de 1840 e que lutava pela reforma agrária, pela distribuição gratuita de terras para os trabalhadores e outras reformas democráticas [N.T.]. 

[19] Há uma alusão irônica aos argumentos e ao uso das palavras por List. As palavras entre aspas de Marx- "freie, mächtige und reiche Bürger" - aludem à expressão "das Aufkommen eines freien, industriellen und reichen Bürgertums" (“aparecimento de uma burguesia livre, industrial e rica) de List na página lxvi [p. 83] de seu livro. Na página lxiv [p. 81], List reivindica o crédito por ter mostrado à nobreza alemã como era rentável para eles a existência de uma burguesia industrial "zelosamente" trabalhando para aumentar as rendas de suas propriedades.

[20] LIST, p. 573

[21] LIST, p. 573

[22] “Confederação” é uma das palavras favoritas de List. Ele fala da “a confederação de várias atividades”, “a confederação de vários conhecimentos”, “a confederação de várias forças”.

[23] LIST, p. 285.

[24] Ibidem, p. 271, onde se lê: “Nós, pela nossa parte, estamos muito longe de rejeitar a teoria da economia cosmopolita, tal como foi desenvolvida pela Escola; somos, porém, da opinião de que também a economia política, ou aquela que Say dá o nome de économie publique, deve ser desenvolvida cientificamente, sendo sempre melhor chamar as coisas pelos seus nomes corretos do que dar-lhes denominações que contradizem o significado das palavras”.

[25] Ibidem, p. 288-289.

[26] Ibidem, p. 291

[27] Ibidem, p. 291

[28] Nas páginas 291 e 292, List exemplifica a diferença entre valores de troca e forças produtivas recorrendo à comparação entre duas famílias, cada uma com cinco filhos e cujas propriedades têm um rendimento líquido anual de 1.000 táleres. Um dos chefes de família coloca os 1.000 táleres num banco à juros e obriga seus filhos a realizarem trabalhos manuais pesados; o outro utiliza a mesma quantidade de dinheiro para educar os seus filhos, para que eles se tornem agrônomos e engenheiros altamente qualificados. Para List, o primeiro chefe de família demonstra preocupação pelo incremento de valores de troca, enquanto o segundo pelo aumento das forças produtivas. A seguir, List faz uma lista de uma série de fontes de forças produtivas, como o cristianismo e a monogamia.  

[29] LIST, p. 294.

[30] List afirma na página 296: “As manufaturas e as fábricas são as mães e as crianças da liberdade burguesa, do saber, das artes e das ciências, do comércio interno e externo, da navegação e dos melhoramentos dos transportes, da civilização e do poder político”.

[31] List afirma na página 298: “É verdade que aqueles que criam porcos ou fabricam gaitas de fole ou pílulas são produtivos, mas os professores da juventude e dos adultos, os virtuosos, os médicos, os juízes e administradores são produtivos num grau muito mais elevado. Aqueles produzem valores de troca, estes produzem forças produtivas”.

[32] List afirma na página 299: “Não se deve julgar o comércio externo da nação unicamente conforme a teoria do valor, como se faz em relação ao comerciante individual, ou seja unicamente tomando em consideração o ganho momentâneo de bens materiais; a nação tem, neste caso, de considerar todas aquelas situações que condicionam a sua existência atual e futura, a sua prosperidade e o seu poder”.

[33] List afirma nas páginas 299-300: “A nação tem de sacrificar e prescindir de bens materiais a fim de adquirir forças mentais ou sociais. Tem de sacrificar vantagens atuais para assegurar vantagens futuras. Ora, se uma força manufatureira desenvolvida em todos os ramos é condição prévia de toda a elevação maior da civilização, da prosperidade material e do poder político de cada nação, como nós pensamos ter demonstrado com exemplos históricos, se é verdade, como pensamos poder comprovar, que nas condições atuais do mundo é impossível uma força manufatureira jovem e desprotegida surgir na livre concorrência com uma outra, já forte há muito tempo e protegida no seu próprio território: como é que então se pretenderá demonstrar, com argumentos tirados simplesmente da teoria do valor, que uma nação, da mesma maneira como o comerciante individual, deva comprar suas mercadorias onde podem ser adquiridas mais baratas?

[34] LIST, p. 300-301.

[35] LIST, p. 289.

[36] LIST, p. 294.

[37] Em uma nota à 4ª edição d’O Capital, Friederich Engels faz um comentário extremamente útil para entender esta passagem. Segundo o revolucionário alemão, “A língua inglesa tem a vantagem de possuir duas palavras distintas para esses dois aspectos diferentes do trabalho. O trabalho que gera valores de uso e é qualitativamente determinado chama-se de work, em oposição a labour; o trabalho que cria valor e é mediado apenas quantitativamente chama-se labour, em oposição a work”. Em outras palavras, é preciso diferenciar o trabalho como a relação entre os seres humanos e a natureza e sua forma histórica capitalista [N.T.]. Em seguida, Marx deixa claro que a “abolição do trabalho” significa a eliminação das formas existentes de exploração do trabalho, como a escravização e a alienação do trabalhador, e sublinha a necessidade de criar condições sociais sob as quais o trabalho industrial e as indústrias deixem de ser objeto e instrumento de opressão, mas que serviam para o homem usar suas capacidades e dominar as forças da natureza.

[38] Marx faz uma alusão à expressão “educação industrial”, usada frequentemente por List.

[39] Por “força manufatureira” (“die Manufakturkraft), List compreende o poder produtivo de uma fábrica. Mas ele frequentemente usa esse termo simplesmente para designar fábrica.

[40] Marx faz uma alusão à declaração de List que sua “teoria das forças produtivas” deveria ser trabalhada cientificamente ("wissenschaftlich auszubilden sei") lado a lado com a “teoria dos valores de troca” desenvolvidas pela “escola Smith-Say”, LIST, p. 271.

[41] LIST, p. 285.

[42] LIST, p. 440-441.

[43] Para o trecho em português, ver RICARDO, David. Princípios de Economia Política e de Tributação. Trad. Maria Adelaide Ferreira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2005, p. 82-83 e 85-86.

[44] Marx faz referência ao argumento elaborado por List no capítulo 24 do seu livro sobre a importância da “continuidade” e “ininterrupção da produção” no desenvolvimento da fábrica, na preservação e aperfeiçoamento dos seus meios técnicos e habilidades produtivas dos trabalhadores. Ao comparar estes argumentos como os de J.F. Bray, Marx tinha em mente o livro Labour’s Wrongs and Labour’s Remedy; or the Age of Might and the Age of Right, Leeds, 1839, quando o autor provou a injustiça da propriedade hereditária de capitalistas e latifundiários como classes improdutivas e parasitárias. Em A miséria da Filosofia (1847), Marx caracteriza as ideias de Bray como comunistas.

[45] As Leis dos Cereais foram adotadas na Inglaterra pela primeira vez no século 15. Seu objetivo era o de proteger os produtores locais, estabelecendo altas tarifas para importação de cereais e, assim, mantendo os preços elevados no mercado interno. No primeiro terço do século 19 foram aprovadas uma série de leis que modificaram as condições de importações dos cereais. A última destas leis, aprovada em 1828, estabeleceu uma escala móvel que aumentava as tarifas de importação dos grãos quando os preços no mercado interno diminuíam e, por outro lado, diminuía as tarifas caso os preços internos aumentassem.  

[46] O termo custos de produção (“Produktionskosten”) é usado por Marx como valor do produto.

[47] Partido político aristocrático e conservador que existiu na Inglaterra entre os séculos 17 e 19 [N.T.].

 


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